Meu depoimento: vale a pena lutar?

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Comentar Ponte Preta. Comentar sobre Guarani. Hoje não quero falar nada disso. Quero falar de vida. Objetivos. Metas. Ambições. Erros. Autocritica. Quando comecei este Só Dérbi em janeiro de 2016 tinha a meta de criar um canal de divulgação de notícias do futebol campineiro, tão maltratado pela mídia nacional.

O tempo passou e o portal é um sucesso. Inesperado. Audiência qualificada. Portentosa. Jamais poderia imaginar. É minha principal realização profissional. Confesso: não dá um tostão sequer. Nada. Zero. Vale a pena. Ou não?

Porque nos últimos dias eu refleti sobre o poder do jornalismo. Poder de transformar vidas ou de destruir reputações. Tem poder de transformar uma comunidade por intermédio da reflexão. Ou acabar com tudo se o caminho incorreto for trilhado.

Neste caminho, cometi erros, desatinos, equívocos. Em alguns instantes dei mais voz a um grupo em detrimento de outro. Recebi como retorno o ódio indistinto daqueles que às vezes se consideram acima do bem e do mal. Mesmo estes acertam. Será que abordei de modo correto? Dei o destaque devido? A consciência pesa. Dói. Porque antes de tudo busco justiça.

Errei em algumas avaliações de Horley Senna, Vanderlei Pareira, Palmeron Mendes, Hélio Kazuo…E se errei qual o caminho? Recuo? Ficar de joelhos? Nada disso. Diálogo. Jornalismo. Com equilíbrio e isenção. Eles querem? Estão dispostos? A questão ecoa na mente: Vale a pena lutar?

Não descrevo por vitimismo  mas por constatação. O meu mundo não é o deles. Dos treinadores, jogadores, dirigentes. A distância aumenta. Fui criado na periferia – sim, o Jardim Amazonas já foi um bairro periférico – e desde criança era apaixonado por futebol. Não podia correr e por vezes nem jogar em virtude de uma asma que me consumia vorazmente. Em outras ocasiões simplesmente não jogava. Porque era ruim. Perna de pau. O futebol me colocou de lado. Eu insisti e me apaixonei por ele.

Perdi a conta das vezes que internado em uma cama de hospital, entre os 02 anos e 15 anos, com máscara, para não ter uma parada respiratória eu ligava um rádio Amarelo, Philips, dado por meu pai. Em primeiro lugar, o Globo Esportivo com Osmar Santos. Em determinado dia, o “velho” deixou o dial no meio. Rádio Central. Brasil de Oliveira, José Arnaldo, Carlos Gonçalves, Álberto César, Renato Silva, Bolinha…Nunca mais desgrudei. Do rádio e do futebol.

Foi o combustível para cursar uma faculdade. Paga. Sem dinheiro. Com um pai trabalhando de segurança de loja com dois salários mínimos de ordenado e uma mãe desdobrando-se em dois empregos. Tudo por um sonho. O meu sonho. Trabalhar com jornalismo. Com futebol.

O tempo passou, girou, adquiri novas experiências e eis que estou na arena. Virei comentarista e cronista esportivo. Outros se consideram melhores do que eu. Tudo bem. Devem ser mesmo. Aqui neste cantinho e no microfone eu acertei, errei, tenho equívocos.

Não é por mal caratismo. Não é por falta de personalidade. E por excesso de paixão. Porque ao olhar em cada arquibancada do Majestoso e do Brinco de Ouro eu ainda vejo aquele menino asmático, doente, que juntava os trocados dados pelo pai só para assistir aos domingos a rede balançar. Que se entupia de remédios para acompanhar as conversas de tios e pais sobre o que era o futebol campineiro do passado.

O comentarista é antes de tudo o menino que deseja voltar a sonhar. Quer ver um sorriso estampado em cada homem, mulher, criança, idoso. Pergunto: vale a pena lutar por isso? Eles vão me ouvir? Quem vai me ouvir?

Cometi erros sim. De avaliação, de informação, de abordagem. Não por maldade. Infelizmente nunca senti pré disposição de auxilio daqueles de quem eu fiscalizo. E os erros ficaram profundos.

Por que? Pela história de vida estamos em muros intransponíveis. Quase inquebrantáveis. Cobro, requisito retornos, mas não adianta. Antes de tudo gostaria de viver uma cidade pautada pelo diálogo, solidariedade. Que as pessoas entendessem as bandeiras que levanto contra o machismo, homofobia, racismo…São temas para quem busca um mundo mais humano. Que não me conformo ver duas equipes acostumando-se com o mediano.

Queria que em cada um desses personagens existisse o espírito da minha mãe, dona Ester, que não se conformou com as adversidades e faturou dois canecos, que foi formar os filhos com curso superior. Se ela conseguiu porque os outros não conseguem? Surge a questão: vale a pena lutar?

Vale a pena? Sinceramente? Não sei. Pareço perdido. O sacrifício talvez imponha algo além da conta. Talvez o reconhecimento do meu trabalho nunca apareça para alguns. Mas enquanto tiver fôlego eu quero olhar para a arquibancada e ver que minha luta ajudou a colocar um sorriso no garotinho com crise de asma, com bombinha na mão. Mas feliz.

(Elias Aredes Junior)