Reflexão: por que ninguém dá certo na Ponte Preta?

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Um jornalista deve ficar de olho em tudo. Prestar atenção até quando as análises despertam o nosso espírito critico. Tal acontecimento encaixa-se perfeitamente em um enunciado escrito pelo advogado Pedro Maciel Neto na minha página pessoal do Facebook no último domingo.

Sua análise foi sucinta e letal: “A Ponte Preta (nós, afinal as instituições são as pessoas, somos nós) tornou-se uma máquina de destruição de profissionais. Nada presta, nada serve para a Ponte Preta. Por exemplo: Tchê Tchê não serviu, Keno não serviu, Clayson não serviu, Guto Ferreira idem, Reinaldo não serviu, Negueba não serviu. Agora Fernando Bob não serve, Aranha é criticado injustamente, Eduardo Batista não serve, Gilson Kleina idem, Nino não serve, Rodrigo, Yago, etc, etc, etc. Se a gente não mudar logo nenhum profissional (atleta ou qualquer outro) vai querer vir pra cá”, disse o advogado.

Merece uma análise pormenorizada. Porque é cristalina a constatação de que o torcedor pontepretano  é impaciente. Existem motivos. Não podem ser ignorados. Ninguém muda de sentimentos à toa, sem motivo palpável. Alguns fatos foram primordiais e colaboraram para o atual estado de coisas. Vou colocar alguns pontos e peço o debate e a troca de ideia. Não é uma tese fechada.

1-A sombra da década de 1970- Temos uma frase entre os cronistas esportivos: “Torcedor gosta antes de tudo é de vencer campeonatos”. O torcedor pontepretano é diferente em alguns aspectos, porque o amor pela instituição está acima da modalidade. Conheço  torcedores que ignoram a Seleção Brasileira em Copa do Mundo e contam os minutos para o retorno do Brasileirão e da Macaquinha. Mas ninguém ignora a busca pela taça. A Ponte Preta luta por ser campeã e já sentiu o gosto do olimpo. Pense que no período de 1977 a 1981 a Macaca foi três vezes vice-campeã paulista, venceu o Guarani em semifinal de competição regional, foi campeão do primeiro turno em 1981, ficou entre os quatro primeiros do Campeonato Brasileiro e faturou Copa São Paulo de Futebol Junior. Ou seja, era um time vencedor.

Os tempos mudaram? Concordo. Integralmente.  Só que quem tinha 12 ou 13 anos naquela época cresceu com um padrão de exigência altíssimo e repassou isso aos seus filhos. E quem era adulto na ocasião hoje compartilha desta exigência com seu filho adulto e com os netos. Passou por instantes de sufoco? Nem ou ninguém ignoramos. Fato. Basta uma retomada para que o torcedor novamente enchesse o Majestoso não só para disputar em alto nível a semifinal do Paulistão e da Copa do Brasil de 2001, a final regional de 2008 e 2017 ou até a Série B de 2014. O desejo era ganhar o tão sonhado título e comprovar de que a fase de ouro era o padrão da Macaca e não um acidente de percurso.

2-O avanço dos Emergentes do Século 21- O Atlético-PR foi campeão Brasileiro de 2001, finalista de Copa Libertadores de 2005, aprimorou sua infra-estrutura e seu estádio recebeu final de Copa do Mundo. A Chapecoense, apesar do acidente que lhe vitimou no ano passado, tem vaga praticamente assegurada na divisão de elite, mas chegou em final de Sul-Americana e está prestes a carimbar sua presença no Brasileirão pelo quinto ano seguido na era dos pontos corridos. Os apressados podem dizer que Santo André, São Caetano e Paulista de Jundiaí ganharam títulos e depois sumiram do pelotão dianteiro. Verdade. Entretanto, dá para dizer que a Ponte Preta ficou no meio do caminho. É superior aos clubes do interior paulista mas nos últimos anos ficou tão obcecada em equilibrar as contas (o que é salutar) que a distância para os clubes de médio porte do futebol nacional ficou enorme. Ou alguém em sã consciência pode considerar o Centro de Treinamento do Jardim Eulina no mesmo nível do CT do Caju do Furação em Curitiba? O torcedor percebe e fica insatifeito. Por perceber imobilismo.

3- A inexistência de craques de excelência nas categorias de base- A reclamação é sobre a falta de paciência com técnicos e jogadores oriundos de outros centros e que desembarcam no Majestoso. É verdade. Doutor Pedro Maciel Neto tem razão. Faltou dizer, no entanto, que historicamente a paciência e o carinho do torcedor da Macaca sempre esteve direcionada para quem é revelado nas categorias de base. Bem, você imediatamente vai argumentar: “Ah, mas o Ravanelli foi revelado no clube e catapultado”. Ok. Mas Ravanelli não é Dicá. O orgulho do torcedor pontepretano era bater no peito e dizer que o clube era capaz de revelar jogadores acima da média. Gente com categoria até para disputar uma Copa do Mundo, casos de Oscar e Valdir Peres. E hoje? Na prática, a Macaca revelou jogadores de capacidade mediana, sem brilho, incapazes de arrastar multidões ao estádio. Querem uma prova? Eleito como grande revelação pontepretana em 2008, o volante Tinga luta por espaço no CRB. Que luta contra o rebaixamento na Série B. Difícil pedir paciência ao torcedor nesta conjuntura.

4- O sentimento de perda de posse- Imagine você sendo proprietário de uma casa. Você investe tempo, dinheiro, sonhos. Um belo dia alguém lhe retira a propriedade. Uma determinada pessoa modifica tudo sem lhe prestar satisfação. O tempo passa e você não reconhece o local que você acalentou na mente. E óbvio, sentirá contrariedade com qualquer medida tomada.

Esta figura de linguagem encaixa-se perfeitamente na Ponte Preta. Talvez nem seja a intenção, mas Ponte Preta está associada a figura de Sérgio Carnielli. A torcida tem a sensação de que ele transformou-se em dono de fato e de direito do clube e sem abrir espaço ás opiniões contrárias. Contrata, dispensa e manda embora sem dar satisfação a quem quer que seja. Como angariar simpatia e boa vontade da torcida diante de um quadro tão caótico em termos de comunicação? O ressentimento não acontece à toa.

5- O desconhecimento dos próprios jogadores sobre o que é a Ponte Preta- Qualquer criança de cinco anos nascida em Campinas sabe o desejo do torcedor pontepretano: time aguerrido, raçudo e jogadores dispostos a entregarem a alma no gramado. Se não fosse assim como explicar a idolatria em torno de Monga até nos dias atuais? Pois é. Muitos jogadores são contratados pela Ponte Preta e jogam no lixo esta cartilha informal. Tocam de letra, entregam-se aos prazeres da gastronomia e da noite e ficam fora de sintonia até com os jogadores históricos da Macaca. Para completar, o rendimento no gramado é pífio. Resultado: divórcio na certa. E resistência da torcida, que não suporta corpo mole.

Poderia citar outros motivos, mas acho que esses tópicos demonstram algo inequívoco: nada acontece por acaso. Nem na Ponte Preta.

(análise feita por Elias Aredes Junior)