Não existe função mais espinhosa do que cortar na própria carne. Olhar-se diante do espelho e admitir falhas, equívocos, problemas. Ter a humildade de submeter-se ao escrutínio do destino. E que é necessário buscar novas tendências. Nestes quase dois anos de Só Dérbi dirigi críticas ácidas e contundentes aos dirigentes, jogadores e treinadores. No fundo, eles são os principais responsáveis por anos e anos sem campanhas regulares e de destaque no futebol brasileiro. Só que também chegou a hora e o momento de abordarmos um tema fundamental. E que este colunista está incluído no balaio. Sem pudor.
Também é culpado. Sim, é isso que vocês imaginam: o trabalho deficitário da imprensa esportiva campineira nos últimos anos colaborou (e muito!) para falta de ideias e oferecimento de alternativas nos gabinetes. E aqui não julgo capacidade de A, B ou C. Somos capazes. Mas podemos render mais e melhor. Antes de tudo, falo de caminhos escolhidos por jornais, rádios, televisões e por portais de internet. Inclusive este que vos fala.
A verdade é que todos nós, em comparação com os principais centros do país, somos e estamos desatualizados e acometidos de uma desunião que é refletido no produto oferecido. Mediocridade em estado puro. Sim, sei que a ideia não é agradável. Eu por exemplo não sou nada popular na categoria. Só que alguém precisa tocar na ferida, buscar a cura de uma doença que acomete todos (eu disse todos!) os profissionais e veículos de comunicação da cidade. Morremos aos poucos como referência e não percebemos.
Por que estamos desatualizados? Porque no fundo no fundo aplicamos a idêntica metodologia dos anos 1980 e 1990. Inclusive este que vos escreve. Somos escravos de uma pauta burocrática, enfadonha, que está mergulhado na mesmice. Só falamos de bola e achamos que basta. Não basta.
Dou exemplos práticos: a rádio Gaúcha de Porto Alegre por muito e muito tempo fez um quadro em que jogadores mostravam a sua playlist no celular. Uma maneira até de exibir o perfil do jogador, suas preferências e sua história de vida por intermédio da música. Na Rádio Itatitaia um dos principais quadros de audiência aos domingos é o “Papo de Boleiro”, em que o repórter Tiago Reis conversa com figuras e personalidades do futebol mineiro.
Enquanto isso, ouvintes campineiros até hoje são saudosos do programa “Você Pergunta e o Brasa Responde!”, em que ouvintes faziam perguntas e questionamentos ao saudoso Brasil de Oliveira. Detalhe: o programa parou de ser exibido há 20 anos! Pergunto: não tem algo de errado? Não cabe uma reflexão? Falo diante do espelho e cobro especialmente deste que vos escreve.
A nova programação da Rádio Globo, por enquanto, não caiu no gosto popular. No entanto, um dos quadros de sucesso é o “Rádio Manivela”, em que são recordados jogos e craques do passado. Pergunta dura, mas que não pode deixar de ser feita: qual Rádio AM ou FM de Campinas tem um arquivo capaz de realizar um programa da mesma magnitude, de idêntica envergadura? Quem pode ressuscitar e levar novamente aos ouvintes programas inteiros com Brasa, Carlos Gonçalves, Dionísio Pivatto, Moacir Gomes, Sérgio Salvucci, entre outros?
Alguns podem sacar do bolso o argumento de que as emissoras citadas nteriormente são de grande porte e de grande estrutura. Concordo. E a tentativa de fazer muito com pouco? E a criatividade? Sumiu? Onde estão reportagens e assuntos que instiguem o ouvinte, telespectador e internauta?
Este que vos fala já cobrou por diversas vezes a presença de técnicos e especialistas da Unicamp e da Puc-Campinas para apurar sugestões. Só que eu também não tive capacidade para fazer matérias e reportagens com essas personagens. Incompetência minha, sem perdão.
Para completar enredo macabro, a desunião. Por anos e anos, a imprensa esportiva de Campinas tinha duas marcas: as atividades da Associação dos Cronistas Esportivos de Campinas e seus eventos na Chácara localizada em Sousas e as caravanas das emissoras de rádio no ônibus da Caprioli para diversas partes do pais. Pergunto: o que sobrou disso? Eu respondo: nada. Desunião exposta a céu aberto. Cada um por si e de preferência que o companheiro de profissão quebre a cara. Não pode dar certo.
Sem contar o machismo impregnado na categoria. Hoje, temos quatro emissoras de rádio, duas emissoras de televisão, diversos portais de internet, um jornal e páginas avulsas de Facebook na cobertura diária na cobertura de Ponte Preta e Guarani e na prática temos apenas três mulheres em total de 40 a 50 pessoas, sendo que uma na Rádio Central, outra na Rádio Brasil e outra na Rádio e TV Bandeirantes. Nós, homens e cronistas esportivos deveríamos ficar corados. De vergonha.
Qual a saída? Sinceramente não sei. Este artigo é antes de tudo uma provocação para sairmos do comodismo. Precisamos atacar ervas daninhas que aniquilam a formação profissional. Quem por exemplo está em início de carreira não deve dizer “eu sou o melhor”, “eu sou top”, (comigo a emissora X é a melhor”) e sim dedicar-se, estudar a exaustão e entender a função do jornalismo esportivo como sacerdócio. E colocar a humildade como lead de vida.
Quanto a nós, que estamos na estrada, cabe admitirmos que somos reféns da mediocridade e temos a obrigação de oferecermos algo melhor para duas torcidas que sonham com dias melhores.
(análise feita por Elias Aredes Junior)