Alguns jogos são componentes do nosso tempo.
Explicam comportamentos, tendências, erros, acertos e provocam recordações infinitas. Não há torcedor do futebol campineiro que não relembre a vitória da Ponte Preta sobre o Guarani por 3 a 2, no dia 05 de agosto de 1981 e que representou o triunfo da Macaca no turno inicial do Paulistão e a classificação automática para a decisão contra o São Paulo.
Foram 90 minutos de um desfile de craques.
De um lado, a genialidade de Jorge Mendonça e de Careca; do outro, o talento, a fineza de Dicá e a volúpia do lateral-esquerdo Odirlei.
A derrota bugrina representou o primeiro revés de Zé Duarte nos dérbis, conforme informou na ocasião os jornais “O Estado de S. Paulo” e “Folha de S. Paulo”.
Não foi por desleixo.
Na semana de preparação, Zé Duarte chegou a marcar um treino para as 07h30. Tudo para fugir do olhar dos repórteres que cobriam o dia a dia do clube.
Só por esse dado dá para apontar este confronto como o principal dérbi do Século 20, inserido em uma conjuntura maluca e intensa vivida não somente no futebol, como na própria sociedade campineira e brasileira.
Cidade de Campinas que na época acompanhava a revolta dos DCE´s (Diretório Central de Estudantes ) da Puccamp (hoje Puc-Campinas), que não conformavam com um aumento de 50,9% nas mensalidades.
O burburinho refletia-se no futebol.
Em todos os cantos.
Nos bastidores da Federação Paulista de Futebol, todas as atenções estavam voltadas para a eleição que seria realizada entre o presidente da ocasião, Nabi Abi Chedid e a oposição representada por José Maria Marin.
O prestigio obtido no gramado reverberava em credibilidade e peso aos clubes de Campinas.
O bugrino Antonio Tavares e Edson Ággio eram os representantes dentro do “Clube dos 07”, que era formado pelos times campineiros, a Portuguesa, o Santos e o trio de ferro formado por Corinthians, São Paulo e Palmeiras. O opositor político dentro da Federação era o “Clube dos 13” (não confundir com aquele fundado em 1987) cujo líder era o mandatário do Juventus, José Ferreira Pinto.
A política tradicional não ficava alheio ao poderio de Ponte Preta e Guarani.
Tanto que o então prefeito José Roberto Magalhães Teixeira, em entrevista aos jornalistas confessava que não sabia se iria assistir ao jogo e em qual arquibancada, a bugrina ou pontepretana. O temor não era à toa.
A mobilização estava em todos os cantos da cidade. Quem não conseguiu ingresso resolveu apelar: subiu no telhado para direcionar a antena para captar o sinal da Rede Globo em São Paulo, já que a TV Campinas, a afiliada, não transmitiria a partida.
As rádios não ficaram atrás. Tudo pela audiência. A Educadora (hoje Rádio Bandeirantes) colocou seus repórteres no Largo do Rosário e de acordo com os jornais da época, divulgou a escalação das duas equipes em primeira mão. No meio da galera.
A promoção mais insólita, entretanto, ficou com a Rádio Brasil, que desafiou um torcedor a trazer um papagaio que assoviasse o hino oficial da Ponte Preta ou do Guarani. Um torcedor bugrino levou o seu animal de estimação, cumpriu a tarefa e ganhou sete ingressos.
No final, o esforço valeu a pena. O derbi eletrizante entrou para a história como o símbolo de um futebol campineiro e de uma Campinas que não existem mais.
(Elias Aredes Junior)
FICHA TÉCNICA
AAPP – Carlos, Toninho Oliveira, Juninho, Nenê e Odirlei; Zé Mário, Humberto (Marco Aurélio) e Dicá; Osvaldo, Chicão (Jorge Campos) e Serginho. Técnico: Jair Picerni.
GUARANI – Birigüi, Chiquinho, Mauro, Edson e Almeida; Jorge Luís, Éderson (Tadeu) e Jorge Mendonça; Lúcio, Careca e Ângelo. Técnico: José Duarte.
Gols: Osvaldo aos 37min e Ângelo aos 45 minutos do segundo tempo; Serginho aos 04min, Jorge Mendonça aos 08min e Odirlei aos 36min do segundo tempo
Local: Moisés Lucarelli – Campinas
Data: 05/08/1981 (Quarta-feira)
Horário: 21:15 h
Árbitro: J. A. Aragão (SP)
Cartão Vermelho: Careca aos 45 min. do 2o. tempo.
Renda: Cr$ 4.247.100,00
Público: 22.167 (21.948 pagantes e 219 menores)