Há 20 anos, o gene da incompetência administrativa crônica está presente no cotidiano do Guarani. Uma série de trapalhadas tirou o clube do lugar de agremiação de porte médio do futebol brasileiro para um sobrevivente em busca de dias melhores. Já esteve pior. Hoje, o seu calendário encontra-se em patamar razoável. O ideal? Divisões principais de São Paulo e do Brasil. E presença regular na Copa do Brasil. É o mínimo.
Neste período turbulento algo positivo aconteceu. A torcida do Guarani não caiu de patamar em quantidade e mudou o seu perfil. Além do torcedor considerado “burguês” ou de classe média a paixão bugrina espalhou-se pela periferia. Gente de diversas profissões e credos adotaram o Brinco de Ouro como sua segunda casa. Válvula de escape para vida sofrida e cheia de carências.
Um novo passo é dado em 2020. De modo manso, sem alarde. O Guarani começa a trilhar os passos para ser um clube de todas as vozes.
Erro crasso é cometido por quem deseja resumir o futebol apenas nas quatro linhas. Qualquer equipe com projeção e de relevância é um fruto da cidade em que está.
Bugrinos que antes faziam sua militância social fora dos estádios e sem a camisa do Guarani, agora batalham por democracia e contra o racismo, homofobia e machismo. Engana-se quem pensa que estes torcedores desejam imputar uma qualidade defeituosa em bugrinos que só querem saber da bola. Nada disso.
O recado é simples. Tais torcedores querem que o Guarani faça parte da vida deles. Integralmente. Tão ou mais importante do que o ar que eles respiram. Compõem a sua identidade e sua visão de mundo. Não conseguem entrar no estádio e deixar do lado de fora questões fundamentais.
Eles querem torcer pelo Guarani e acolher o jogador negro que sofre com o racismo; Deseja abraçar o homossexual vítima de tantas injustiças e atos violentos e que encontra no futebol um espaço de acolhimento. Quer e luta para que a mulher que senta-se em uma arquibancada seja respeitada. E que a democracia seja exercida nos pequenos detalhes. No respeito a uma opinião divergente sobre a diretoria. Ou que em um bate-papo no intervalo do jogo todos possam até falar de suas preferências políticas. Sem ódio ou rancor.
O bugrino aprecia ligar o clube a duas palavras: amor e família. Quando um coletivo antifascistas levanta-se nas arquibancadas, os torcedores que são contrários, antes de desferir qualquer critica deve pensar: família que ama acolhe os seus sem distinção. E focam naquilo que é o bem maior: um Brasil mais justo, solidário e um Guarani vencedor. No campo e na arquibancada.
(Elias Aredes Junior)