Guarani e a terceirização do futebol e das categorias de base: reflexão, debate e ponderação não fazem mal a ninguém

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O Guarani tomará no dia 08 de janeiro uma decisão capaz de definir o seu futuro pelos próximos anos. O Conselho Deliberativo analisará a proposta de parceria – ou terceirização como queiram – do departamento de futebol profissional e ainda das categorias de base por um prazo de 10 anos.

As informações são desencontradas. Em entrevista na semana passada ao programa “Central Esportiva”, o presidente Palmeron Mendes Filho assegurou que a proposta terá salvaguardas ao clube e que haverá poder de veto caso a empresa queira tomar uma medida que vá contra os interesses da agremiação.

Neste Só Dérbi, o ex-presidente Horley Senna deixou clara a sua posição: 10 anos é um prazo longo de terceirização e uma temeridade deixar só 20% do total arrecadado na mão do clube. O ideal seria a vigência do contrato durante o mandato do atual Conselho de Administração.

De modo superficial, alguns podem considerar que basta assinar o contrato, conceder o futebol na mão de um desconhecido da comunidade é pronto. Em um passe de mágica, o Guarani voltará aos tempos de glória e a chegada na divisão de elite é uma questão de tempo. Não é bem assim.

Em primeiro lugar, é dever compreender as características do futebol brasileiro. Os clubes foram formados a partir do desejo de comunidades ou de grupo de pessoas. Não há proprietários e donos. Digo isso para dizer que na atual conjuntura, mesmo com um colégio eleitoral parco, o ideal seria submeter a proposta para uma Assembléia de Sócios.

Chamar a comunidade bugrina para definir se a proposta deve ser aceita. Não, não é salutar abraçar o Londrina como modelo. O Tubarão teve intervenção da Justiça, viveu tremendas dificuldades para se reerguer e o empresário Sérgio Malucelli fez um acordo com anuência da Justiça Trabalhista. O Guarani não chegou neste estágio. Não há intervenção em vigor.

Outra: a terceirização é uma confissão de incompetência. De admitir que não há ninguém, absolutamente ninguém vinculado ao Guarani, capaz de tocar o clube e promover novas vitórias.

O que chega ser lapso de memória. Basta dizer que, mesmo contestados pelas arquibancadas, Marcelo Mingone, Leonel Martins de Oliveira e Horley Senna produziram resultados positivos no gramado. Sem terceirização.

Ou seja, Palmeron e seus aliados de Conselho de Administração confessam que não conhecem de futebol e que não desejam aprender. Triste, mas é a realidade.

Então, deve-se descartar a proposta? Nada disso. Medidas devem ser tomadas antes da realização da reunião do Conselho. A primária seria uma espécie de audiência pública, em que os dirigentes e os possíveis mandatários pelos próximos 10 anos seriam sabatinados pelos componentes do Conselho Deliberativo e associados. E sem hora para terminar.

A proposta deveria ficar a disposição de qualquer associação para ler por um prazo de semana e só posteriormente a votação aconteceria. E com a aprovação, o locatário tanto do departamento de futebol profissional e das categorias de base seriam obrigados a assumirem uma série de compromissos e patamar de investimentos. Definir o percentual de cada componente do contrato é pouco. É preciso definir obrigações e direitos e sanções para o não cumprimento, tanto para o clube como para o empresário interessado.

Todos esses cuidados  e evitar exemplos mal sucedidos. Ou alguém esqueceu o exemplo mal sucedido do Paulista de Jundiaí, que chegou até a perder identidade e mudar de nome? Pois é.

Um concorrente da Série B já abraçou a tese e por enquanto espera os frutos. O Figueirense aprovou, em agosto deste ano, a terceirização do futebol por 20 anos e com possibilidade de renovação por mais 15 anos.  Por enquanto, não há conhecimento sobre os controladores e o CEO é Alexandre Borgeouis, cuja última experiência foi no São Paulo.

No gramado, convenhamos, a mudança produziu poucos resultados no time catarinense, que viveu acossado pelo fantasma do rebaixamento. Mas o contrato do Figueirense tem salvaguardas: os controladores precisam deixar o Figueirense na primeira divisão nacional em 75% do tempo do contrato e um rebaixamento para a terceirona decreta o rompimento do acordo.

Dei estes exemplos para mostrar que o Guarani já pagou um preço alto demais por causa de dirigentes que adotaram medidas intempestivas e sem nexo. Não pode repetir o erro. Se ocorrer a terceirização do futebol e das categorias de base, que ela seja adotada após intenso debate e com a revelação dos prós e contras. Fora disso, é dar um tiro no escuro.

(análise de Elias Aredes Junior)

2 Comentários

  1. Acho a saída boa, sim, e o debate é muito saudável mas conceitos precisam ser definidos. Acho que, como contador e auditor, tendo já participado de auditoria no próprio Guarani, posso opinar com propriedade:
    Veja um exemplo: “Marcelo Mingone, Leonel Martins de Oliveira e Horley Senna produziram resultados positivos”. Pena que o cronista ecoa o pensamento de curto prazo que prolifera no meio futebolístico, o de “resultados positivos” apenas com os resultados em campo. Afinal, que “resultados positivos” foram estes? Mingone foi vice paulista e depois rebaixado, Leonel idem em 2008/2009 e 2009/2010 e Horley, se não foi rebaixado, fez campanha pífia no Paulista da A2. Uma empresa tem o que no Guarani e em qualquer entidade desportiva no Brasil ainda não conhece: O princípio contábil da continuidade. Não basta apenas um resultado bom num torneio e a não-continuidade no seguinte, uma empresa quer lucro continuado, e para isto seus investimentos devem atrair o retorno pela maior quantidade de tempo possível.
    10 anos é muito? Não acho, pois 5 anos é um tempo que passa muito rápido e, provavelmente, onde o retorno dos sócios começam a acontecer, que empresa investiria seus recursos ao saber que, no início de seus retornos já teria que sair? O que provavelmente pode acontecer é uma valorização da marca, onde outras empresas podem aparecer e aquela inicial que teve os maiores custos ficar sem.
    Eu, pelo menos, não espero que tudo fique bom como num passe de mágica, há, sim, um risco, mas o risco que ainda corre o Guarani pela falta de recursos é maior, muito maior!
    O Guarani e a grande maioria dos times brasileiros passam, sim, um atestado de incompetência. Pois não são gestores, não são profissionais. E mesmo que resolvam, de repente, Contratar gestores competentes? Mas, com qual recurso?
    Que seja ampliado o debate e mostrado os números atuais do Guarani, os prós e contras da terceirização e os prós e contras de continuar como está.

  2. Quero parabenizar o Vagner pelo seu comentário . Foi muito claro . Gostaria de ter escrito este texto.

    Aproveito também para “cutucar” a nossa imprensa esportiva local . Acho que ela, como formadora de opinião e atua de forma inadequada ( por falta de informação e conhecimento no assunto) pode acabar tumultuando está discussão ( no sentido de tirar o foco) . Seria adequado que também se informasse melhor gestão , investimentos , etc..
    A profissionalização do futebol também passa pela gestão econômica dos clubes , este tema muito muito quando comparamos com o amadorismo o nosso futebol .
    No modelo que está o Guarani não vai voltar a ser o maior do interior.