Existem pessoas resistentes ao saudosismo. Respeito. Talvez viver o presente, projetar o futuro e minimizar o passado seja uma maneira de andar e buscar objetivos.
Toda atitude tem consequências. Neste caso, perdemos valores universais e esquecemos de resgatá-los.
O técnico Milton Mendes e o zagueiro Rodrigo protagonizaram uma cena de agressão após o empate sem gols entre Ponte Preta e Vasco da Gama no estádio Moisés Lucarelli.
O comandante vascaíno pediu registro no distrito policial. O jogador de 36 anos utilizou sua conta no instagram para justificar e explicar o episódio.
Observo os dois lados e não deixo de verificar a perda de referenciais. Exemplo: há 30 ou 40 anos, tal episódio seria inimaginável. Não importa que Milton Mendes tivesse sido grosseiro ou mal educado. Rodrigo, 16 anos mais novo, abaixaria a cabeça e caminharia. O episódio terminaria nisso. Por que? Existia um referencial de hierarquia. Mais novos respeitavam os mais velho. Ponto final.
Você pode argumentar que os tempos são novos, não existe nada disso. O que dizer então de um conceito universal como o perdão?
Em 1986, Renato Gaúcho era o principal jogador do futebol brasileiro. Explosivo e letal com a camisa do Grêmio. Um belo dia, durante a preparação para a Copa do Mundo de 1986, o atleta, acompanhado do lateral Leandro, outro titular absoluto, esticaram uma balada às vésperas da viagem ao México. Vários outros jogadores ficaram acordados até as 4 horas da manhã e esperaram por Renato e Leandro. No fim, o incidente atrapalhou o treino do dia seguinte. Renato foi cortado pelo técnico Telê Santana e o lateral-direito flamenguista saiu em solidariedade.
Por anos e anos, Renato escancarou sua mágoa com o treinador. Estava no auge. Poderia ajudar na conquista do títulomundial. Anos depois, o atleta encontrou o treinador antes de uma partida lhe deu um beijo para encerrar o episódio. Sim, o episódio feriu, algo exposto até pelo atual treinador do Grêmio. Renato Gaúcho, no entanto, colocou uma pedra no assunto e seguiu em frente.
O que acontece no episódio Rodrigo x Milton Mendes? As duas partes estão com punhos levantados, prontos a um novo round. Uma plateia virtual sedenta por sangue, discussão e polêmica. E jornalistas prontos a descreverem o novo episódio.
Talvez poucos tenham coragem de apontar o óbvio: o episódio é o reflexo de um país doente, dilacerado em seus conceitos de paz, justiça e harmonia e que trocou o entendimento pela violência gratuita.
Um Brasil que poderia utilizar o futebol como instrumento de congraçamento e solidariedade, utiliza a modalidade como combustível para detonar espirais de violência.
Não há diálogo, conversa, educação, respeito a opinião divergente…Nada. Virou um salve-se quem puder.
O episódio entre Milton Mendes e o zagueiro Rodrigo demonstra que o futebol é sim espelho da sociedade.
Uma sociedade que perdeu seus parâmetros e que considera violência e a selvageria não como quebra de códigos de convivência e sim justificativa e instrumento para humilhar o semelhante. Pior: no fundo, não queremos mudança alguma. Desejamos é mais sangue. Muito triste.
(análise feita por Elias Aredes Junior)