Carta aberta ao Presidente de Honra da Ponte Preta, Sérgio Carnielli

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Olá?

Tudo bem?

De coração, espero que sim. Este texto é importante. Pelo menos para quem escreve. Relutei por meses e meses. Não por aquilo que eu iria dizer, mas por tudo aquilo que diziam a seu respeito. “Tome cuidado”, “Eu se fosse você não faria isto”, “Ele não vai gostar”, entre outros conceitos. Não acredito. Não creio. Por um motivo: quem veio debaixo, quem construiu sua trajetória com suor e tijolo por tijolo é impossível não ter sido alertado alguma vez na vida. Ninguém em sã consciência deve se considerar Deus, todo poderoso.

Ainda mais um homem com uma história de superação. E de triunfo. Uma força capaz de, em 1997, salvar uma nação. Lembra-se? Você estava lá, tranquilo na Tecnol, com timaços no futebol amador. Poderia ficar ali. Para sempre. Até que você aceitou o convite para ser vice-presidente na chapa de Nivaldo Baldo. Alguns meses depois, veio a turbulência política e o poder caiu no colo. Você não recuou. Salvou a Ponte Preta.

Buscou um sonho que era de todo mundo. Ao lado do então dirigente Marco Antonio Eberlim, construiu um alicerce duro, sólido e, após o acesso na Série B em 1997, quatro anos depois, o ápice: semifinal do Campeonato Paulista, da Copa do Brasil e das quartas de final do Campeonato Brasileiro. A Macaca ressurgia como Fênix e você Sérgio Carnielli, era “o cara”. Aquele que arrebatava a tudo e todos.

Tempestades surgiram. Como em 2003. Atrasos de salários e ameaça de rebaixamento, além de medo e angústia. O destino lhe sorriu. A vitória por 2 a 0 sobre o Fortaleza teve sabor de conquista de Copa do Mundo.

Três anos depois, uma briga com Marco Antonio Eberlim lhe deixou sozinho. Precisava recomeçar do zero. Arregimentou pessoas e, com Sérgio Guedes no banco de reservas, alcançou a final do Campeonato Paulista.

Aquela frustração juntamente com o rebaixamento no Brasileirão de 2006 talvez lhe tenha gerado revolta e inconformismo. Como o seu amor não era recompensado pelo destino? Por que sua determinação em levar a Ponte ao olimpo não era retribuída? Em um ato de desvario e de paixão, você começou a injetar dinheiro no clube. Mês a mês. Sem pudor. Tudo direcionado ao departamento de futebol. Contratação de jogadores, técnicos, melhoria de estrutura: valia tudo para deixar a Ponte Preta na Série A e voltar a sonhar.

A voluntariedade e a determinação eram típicas de um herói em busca do reconhecimento. Um homem de ferro sem armadura, mas com grana. E gana. As peças eram pregadas sem avisar. O afastamento da presidência, admito, foi um duro golpe. Já era um aviso: com diálogo, abertura ao novo e tolerância com os diferentes, tudo seria evitado.

A agonia lhe tomou conta. Não deve ser fácil ter mil planos e ficar na dependência de outros. Primeiro com Márcio Della Volpe – com quem você rompeu – e depois com Vanderlei Pereira, seu amigo de todas as horas. Vice-campeonato de Sul-Americana em 2013, acesso na Série B em 2014, final de Campeonato Paulista em 2017. Sem nenhuma dose de ironia, não devia ser fácil ver a imprensa em cima dos dirigentes a cada feito e você escondido em um canto, como se não tivesse nada a ver. E sim, existe sua participação. Decisiva.

Ninguém admitia. A torcida parece querer esquecer. Os dirigentes te exaltam nas vitórias, mas omitiam seu nome nas derrotas. Questão de preservação. O que significa? Peço perdão pela dureza na declaração, mas a verdade é única: você está sozinho, Sérgio Carnielli.

Não me refiro à solidão no seio familiar ou dos amigos. Esta é repleta. Mas um dirigente de clube só está bem acompanhado quando a torcida lhe abraça e aprova suas decisões. Perfila-se ao seu lado para defendê-lo. E o que vemos hoje? No Paulistão, a pecha  de vencedor ficou com Pottker, Clayson e Lucca. No rebaixamento, você ficou no topo dos culpados, ao lado de Vanderlei Pereira ou Gustavo Bueno. E o recado da torcida é o mesmo: “Você nos abandonou. Não quer saber o que pensamos e desejamos”. E cá para nós: aquela eleição, cheia de seguranças e com apenas 250 votos contabilizados, é uma prova de que você está isolado. Você e seu grupo político tem o poder de direito. Não tem de fato.

Mais: vou tocar em um tema delicadíssimo. Fiquei sabendo que vocês da diretoria executiva consideram que só ouço pessoas da oposição. Nada disso! São vocês que não escutam ninguém. Não querem ouvir. São vocês que parecem incapazes de perceber a finalidade do jornalismo como instrumento de transformação e reflexão. E que tal característica não é um privilégio dos salões escuros e luxuosos da Hípica de Campinas ou de associação cheios de endinheirados.

Não quer conversar comigo ou com qualquer jornalista? Concordo, Carnielli, não perca seu tempo. Converse com o torcedor. Relembre o tempo em que você adentrava em um boteco de um bairro periférico qualquer e, mesmo triunfante na vida profissional e financeira, não se furtava em colocar o cotovelo no balcão para ser mais um. Aquele “um” que poderia fazer a diferença.

Para 2018, você e Vanderlei deveriam esquecer por um instante o poder, dinheiro, transações, bajuladores ou sapatos ou camisas de luxo. Sejam pontepretanos. De corpo inteiro. Respirem o ar e desfrutem do orgulho, da satisfação e da emoção que brota de cada faxineiro, pedreiro, jardineiro, engenheiro, arquiteto, advogado ou qualquer pessoa que veste a camisa da Ponte Preta pelas ruas de Campinas.

Descubra dentro da sua alma aquela semente de criança, aquele frescor que lhe fez um dia sair do seu escritório e reconstruir um clube de massa, que chora e vibra. E que agora deseja um pai. Não um padrasto no pior sentido da palavra.

Carnielli volte ao primeiro amor. Você só tem a ganhar. E a Ponte Preta e a torcida também.

Com estima, um abraço de

Elias Arredes Junior