Antes do surgimento das guerra dos programas de auditórios nas tardes de domingo, a televisão brasileira era o território dos enlatados. Em meados da década de 1980, um seriado importado dos Estados Unidos fazia furor entre crianças e adolescentes. Chamava-se “Profissão Perigo” e tinha como estrela principal o ator Richard Dean Anderson, que fazia o principal de um agente a serviço da empresa Fênix.
O que ele tinha de tão especial? Mac Gyver transformava qualquer material em instrumento para se salvar ou para aniquilar os seus inimigos. Ele parou um contador de uma bomba usando um clipe de papel. Em outro episódio acabou com um vazamento de ácido sulfúrico aplicando uma barra de chocolate na fenda. Com uma lente de binóculo e um cigarro aceso, passou tranquilo através de uma sala protegida por uma rede de laser. Ao utilizar uma embalagem de goma de mascar, ele reativou um fusível queimado. Ainda improvisou um extintor de incêndio com vinagre e refrigerante. São muitos apetrechos criados por esse agente fictício.
Se levarmos ao pé da letra, todo técnico de futebol tem um pouco de Mac Gyver. Técnico de futebol é pago para levar sua equipe ao olimpo. Ou para chegar ao acesso que tire do o clube do atoleiro. Técnico improvisa, escala de modo surpreendente ou em um último caso, no calor do jogo, tem que se virar com as opções do banco de reservas para transformar uma equipe combalida em uma fortaleza.
É, o futebol fez com que Hélio dos Anjos virasse o Mac Gyver da vez. Graças a atitudes impensadas de seus jogadores, o treinador pontepretano terá que se virar na escalação para o jogo decisivo contra o Comercial. Perdeu Jeh e Pablo Diego após duas expulsões que beiram ao injustificável. Qual o tamanho do prejuízo? Dos 30 gols marcados pela Ponte Preta na Série A-2, 12 foram marcados pela dupla. Ou seja, 40% do total.
Sejamos sinceros: para chegar ao acesso, o time titular pontepretano é mais do que suficiente. Mas o elenco é limitado. Tal limitação escasseia as opções confiáveis. Gui Pira é lutador, tem velocidade mas peca na hora do último passe ou da conclusão. Já Eliel é pedra preciosa e com caracteristicas típicas dos atacantes recém-promovido das categorias de base. Em um jogo é capaz de se movimentar e fazer o gol da vitória. Nos 90 minutos seguintes mal consegue pegar na bola.
Comportamento normal para quem começa no Mundo da Bola.
E aí que Hélio dos Anjos terá que utilizar a sua porção de Mac Gyver. Evidente que Élvis é uma arma poderosa. Só que pense que muitas passagens do jogo ele não terá a disposição a jogada mortal de contra-ataque com os atacantes titulares. Mas dos seus pés podem ser sair preciosos cruzamentos pelas laterais ou as cobranças de falta. Nunca deve se perder de vista o essencial: Élvis é muita coisa mas é insuficiente.
Hélio dos Anjos terá que se virar nos 30 por um outro motivo: o regulamento equivocado da Série A-2. Vamos raciocinar: a Macaca jogou 15 partidas na fase inicial, somou 36 pontos e fica em primeiro lugar. No primeiro jogo das quartas de final, a equipe consegue um empate que em qualquer competição bem elaborada abriria espaço para celebração.
Nada disso. Na prática, depois de mostrar-se superior aos adversários, a Ponte Preta vai decidir a sua vida com necessidade de vitória. Empate? Decisão nos penaltis. Quer injustiça maior do que essa? E aos que pregam que isso vale a pena em virtude da emoção do Mata mata eu afirmo: futebol profissional e de alto rendimento não é para brincar com as emoções do torcedor e sim para apurar o melhor. Não somente no dia, mas em toda a competição.
Com tal conjuntura adversa, Hélio dos Anjos terá que exibir uma outra caracteristica dos agentes secretos: a frieza diante do perigo. A Ponte Preta precisa buscar a vitória. Necessita chegar às semifinais e buscar o acesso. Mas com a cabeça fria e o coração quente. E com astúcia para fugir das armadilhas e dos perigos. Assim como fazia Mac Gyver nas tardes de domingo.
(Elias Aredes Junior com foto de Diego Almeida/Pontepress)