Responda sinceramente: você sente falta do dérbi?

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Quando conseguiu o acesso para a divisão de elite nacional em 2003, o goleiro palmeirense Marcos fez uma declaração emblemática: “Graças a Deus teremos novamente Corinthians e Palmeiras no Brasileirão”. Uma declaração sincera, tocante e de plena noção do que é o esporte e as rivalidades. Pois eu digo que está na hora de Campinas e seus habitantes deixarem de ostentar disfarce: o dérbi campineiro faz falta . Não só para a cidade, mas para o futebol brasileiro.

Não dá mais para engolir o discurso de bugrino que defende a ideia de que a Ponte Preta não tem capacidade de ser campeã ou de encontrar-se na divisão de elite. Papo que flerta com o engodo até pela postura da Macaca nos últimos anos. Como também é um absurdo querer vender como verdade que o Guarani acabou, está extinto. O Botafogo deve R$ 800 milhões, tem times limitados. Está acabado? O que dizer então do Fortaleza desde 2012 na Série C do Brasileirão? É sinal de falência?

Sinto muito, mas isto cheira a desculpa esfarrapada, de um lado ou de outro. Detalhe: o conceito vale para os dirigentes, torcedores influentes e até a estrutura envolvida com o futebol de ambas as equipes.

Se a rivalidade está tão adormecida ou até morta como querem pregar grupos alviverdes e alvinegros, como explicar a reação da torcida rival a cada derrota? Tenho torcedores pontepretanos e bugrinos nas minhas redes sociais e o comportamento é padrão. Se o Guarani perde, artes e brincadeiras são enfileiradas pelos pontepretanos enquanto que a tabela do Brasileirão é acompanhada de modo quase fanático pelos bugrinos. A cada tropeço, as derrotas pontepretanas são celebradas como se fosse conquista de título. O discurso do desprezo é arrebentado pelas atitudes.

O ano de 2013, aliás foi emblemático. Em abril, o Guarani rebaixado em último lugar no Paulistão e a torcida pontepretana lançou o slogan “meu rival faliu”, algo reprisado a cada fato negativo ocorrido no Estádio Brinco de Ouro. Em contrapartida, quando a Macaca perdeu a final da Copa Sul-Americana, fogos de artíficio foram testemunhados em várias partes da cidade de Campinas. Eram palmeirenses? Corinthianos? São paulinos? Ora, não vamos nos enganar. É lógico que eram bugrinos. Em Campinas, a teoria e a prática choquem-se diariamente.

Na atual temporada, não é diferente. O bugrino aguarda com ansiedade cada derrota e quer ver a Macaca no pior quadro possível na divisão de elite enquanto que o pontepretano está na cadeira e presencia de camarote a campanha na Série C. Se o Guarani subir, o pontepretano vai dizer que isto não lhe afeta porque o Guarani está na segundona nacional. Se perder nas quartas de final ou for eliminado na fase inicial, os memes e as piadas estarão prontas. No dia seguinte, tanto um lado como o outro praguejam a mentira deslavada: “Eu não ligo para o meu rival”.

Campinas e seus torcedores de times locais dariam um passo rumo ao amadurecimento se admitissem que sim, ligam para tudo aquilo que acontece de um lado ou de outro. Deixasse na gaveta o discurso apaixonado e alienado de que cada um deve viver sua vida e pouco se importa se ganha, perde ou empata.

Vá nos arquivos de jornais da capital paulista e compare o destaque dado aos dérbis nas décadas de 1970, 1980 e 1990 e neste século. Perceba o destaque e o enfoque. Abordam o dérbi como algo grandioso, espetacular, fora de série. Quando cada um separadamente encara um gigante nacional o tratamento não é o mesmo. Em 2008, a Ponte Preta foi tratada como azarão diante do Palmeiras. Quatro anos depois, o Guarani sequer foi cogitada como desafiante diante do Santos. E os dérbis ? Enfoque bem diferenciado…

No entanto, algo precisa ser dito: se o dérbi não acontece na atualidade, especialmente nos últimos três anos é por culpa exclusiva do Guarani, envolvido em problemas administrativos e ausência de timming para montar times competitivos para buscar os acessos.

Agora, querer utilizar o fanatismo e a paixão de lado a lado para defender a inutilidade do clássico não é apenas uma declaração incoerente. É, antes de tudo, uma confissão de desconhecimento da história do futebol brasileiro e daquilo que foi feito no interior do Estado de São Paulo.

(análise feita por Elias Aredes Junior)