Campinas, Guarani e Ponte Preta: um processo de decadência lenta, gradual e insegura

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Semana amarga ao futebol campineiro. Na terça-feira, a Ponte Preta perdeu do Aparecidense. Pouco importa apelação judicial. Na bola, a Macaca protagonizou um vexame. No dia seguinte, o Guarani foi derrotado pelo Avenida com um segundo tempo para esquecer.

Os 180 minutos custaram no total R$ 1,2 milhão aos dois clubes. Não serei hipócrita ao voltar atrás. Acredito que a presença de ambos em diversas competições fez as respectivas diretorias se movimentarem e tentarem algo novo. Agora, um clássico inesquecível no dia 16 de março não fará botar para debaixo do tapete um conceito duro, cruel, mas verdadeiro: somos pequenos, atrasados e provincianos. E apesar da reação em algumas áreas, os dois clubes vivem um processo de decadência lenta, gradual e insegura. Assim como a própria cidade

Pedro Antonio Chaib: representante da época de ouro da Ponte Preta e da cidade de Campinas

O futebol não está dissociado da vida. Estamos submersos em uma crise profunda de conceitos e de relevância no futebol campineiro há pelo menos 20 anos e que só foi interrompido por espasmos, como o vice-campeonato pontepretano no Paulistão em 2008 e 2017, o segundo lugar na Sul-Americana de 2013 e o vice bugrino no Paulistão de 2012 e a conquista da Série A-2. Ouso dizer com o devido distanciamento histórico que tal desempenho foi fruto muito mais de um acidente de percurso do que algo planejado e construído.

A história é velha mais custa lembrar. A época de ouro do futebol campineiro, de 1976 a 1988 tinha alicerces sólidos. Dirigentes nativos, outrora alguns oriundos do futebol amador local –vide o Gazeta que produziu Peri Chaib- e até treinadores forjados nos gramados locais como Zé Duarte e Cilinho.

Dirigentes criativos nos clubes; políticos influentes na cidade

Era um reflexo do que ocorria na própria cidade. Campinas era um município emergente, próspero e celeiro de novas lideranças políticas  que combateram a ditadura militar instalada. Orestes Quércia, Francisco Amaral e José Roberto Magalhães foram todos oposicionistas e ocuparam o cargo máximo da cidade. Acople ainda o fato de que este período serviu para o desenvolvimento da Unicamp como centro intelectual do Brasil. Campinas, por sua vez, era exemplar em termos de qualidade de vida e tinha um fluxo migratório que mudava a cara da cidade, mas aderia as características locais. Exemplo: se alguém vinha de Minas Gerais, do nordeste ou de qualquer região do Brasil escolhiam Guarani ou Ponte Preta pra torcer. Ou seja, os dois times acompanhavam aquilo que acontecia no município.

Onde ocorreu a mudança de rota? Talvez a gente não consiga perceber, mas Ponte Preta e Guarani entraram no mesmo labirinto vivido na cidade. A partir da entrada de Jacó Bittar em 1989, apesar de muitos elogiarem os feitos de sua administração, Campinas entrou em um clima de conflagração tal que os embates e problemas políticos e urbanos acumularam-se de maneira estrondosa. Coincidência, em 31 de julho de 1998, a derrota do Guarani na final do Paulistão representou o final da época de ouro do futebol campineiro. Quatro meses depois, Jacó Bittar chegou ao poder e inaugurou um período político marcado por incertezas e brigas políticas quase eternas.

Leonel Martins de Oliveira: ativado como salvador da pátria em 2006

O começo da decadência

O fato incomodou tanto que ocorreram diversas tentativas de reconstruir o brilho do município por intermédio de lideranças antigas. Magalhães Teixeira entrou em 1993, faleceu durante o mandato e não teve o brilho da passagem anterior; Chico Amaral voltou em 1997 e foi um desastre, assim como após o assassinato de Toninho, o PT perdeu todo o protagonismo com Izalene Tiene.

E em Ponte Preta e Guarani? Na Macaca, Lauro Moraes voltou como salvação da lavoura e levou o time à primeira divisão do Paulistão em 1989; posteriormente, Marco Antonio Abi Chedid, Peri Chaib e Nivaldo Baldo exerceram seus mandatos sujeitos a chuvas e trovoadas.Uma típica perda de rumo.

No Guarani, apegado a um passado eficiente, o grupo político de Leonel Martins de Oliveira conseguiu manter-se no poder até o final de 1987, quando abriu espaço para Beto Zini, que ficou no cargo por 11 anos. Sem abrir espaço para formação de novas lideranças, Zini foi substituído por um dirigente sem grande destaque, José Luis Lourencetti, que protagonizou um período desastroso, com três rebaixamentos e a obtenção de dividas e mais dividas.

O que fez o Guarani para retomar os bons tempos com tantos desacertos? Assim como a Ponte Preta apelou ao passado. Leonel Martins de Oliveira retornou ao poder para ficar por cinco anos e amargar mais três rebaixamentos e a ausência de atualização de gestão. Enquanto isso, o rival continuava preso ao personalismo administrativo de Sérgio Carnielli, que assim como Zini, nunca abriu espaço para ninguém.

Conformismo e desalento

Quais frutos de tais desacertos? Fácil concluir ao olhar tanto para os dois clubes como para as ruas do município. Se antes Campinas produzia protagonistas nacional, hoje a cidade é dirigida por um clássico político de porte médio, sem qualquer chance de galgar postos elevados em nível estadual e nacional.

Nos dois clubes campineiros, temos comandantes medíocres, sem inventividade, incapazes de formularem métodos que produzam um salto de qualidade e de estrutura. Os resultados ruins se acumularam e hoje o campineiro não tem qualquer esperança de dias melhores e o torcedor bugrino e pontepretano idem.

Jonas Donizete: o símbolo de uma cidade e de clubes que ficam satisfeitos com a capacidade mediana

Para quem já foi considerado um oásis de relevância no interior paulista, Campinas por vezes provoca no seu cidadão o desejo de mudar-se para um novo centro que lhe novas perspectivas. Campineiro que prefere hoje escolher torcer para Corinthians, Palmeiras, Santos ou São Paulo do que encampar a paixão local e centenária.

Qual rumo para adotar

Ele faz isso porque não vê perspectiva de crescimento. A imprensa, que poderia ser um canal de debate e discussão, está perdida nas demandas do cotidiano. Nossa indignação por uma derrota contra o Aparecidense ou contra o Avenida dura segundos. Assim como é efêmera o lamento pela falta de transporte, saúde e educação na cidade. Achamos que tanto a cidade como os times estão enraizados na incompetência. Não vai melhorar.

Devemos nos contentar com o pessoal e acostumarmos com a nossa pequenez. Triste. Desesperador. Mas foi a fórmula construída no Palácio dos Jequitibás, no Moisés Lucarelli e no Brinco de Ouro capaz de destruir a paixão pela cidade e suas equipes. Quem vai nos tirar desta letargia? Não sei. Uma resposta convincente, por favor. Antes que seja tarde demais.

(análise feita por Elias Aredes Junior)