Guarani, política, palanque e como transformar o secundário em prioritário

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A Série B do Campeonato Brasileiro não recebe a mesma atenção da mídia em relação à divisão de elite. Nada mais natural. Isso não impede o andamento de processos de corrosão de clubes e de marcas quando a incompetência prevalece na condução do futebol profissional. A atual edição tem equipes tradicionais, como o Santos, campeão da Libertadores e vencedor neste século de duas edições do Campeonato Brasileiro. Conta com Coritiba, Sport, Ceará, Goiás e América Mineiro. Integrantes deste mosaico chamado futebol brasileiro. Nada, porém, se assemelha ao que ocorre com o Guarani, campeão brasileiro de 1978, vencedor da Taça de Prata de 1981 e responsável por fornecer inúmeros craques para a Seleção Brasileira.

Os dirigentes atuais alardeiam que colocaram as contas em dia, que não existe atraso de salários e que um processo de Recuperação Judicial está em curso para salvar o clube. Estes mesmos dirigentes comandam o Departamento de Futebol Profissional e conseguem construir a marca de três vitórias nos últimos 27 jogos. Pior: no Paulistão deste ano somou dez pontos e escapou por um triz do vexatório rebaixamento.

É o caso de raciocinar: se eu comando um time com três pontos em sete rodadas na Série B e dentro da zona de rebaixamento, o natural seria dedicar-me totalmente para salvar o clube da terceira divisão nacional.

O cenário é o oposto. Derrota após derrota na Série B, os integrantes do Conselho de Administração do Guarani, presidido por André Marconatto, não aparecem, não dão satisfações e explicações. Tem como braço direito o presidente anterior, Ricardo Moisés, hoje CEO da agremiação.

O que ninguém esperava era a presença de boa parte dos dirigentes bugrinos na quarta-feira, dia 29 de maio, em um evento realizado nas dependências do ginásio do Guarani para angariar doações às vítimas das enchentes no Rio Grande do Sul. Ninguém vai condenar uma atividade feita para ajudar pessoas em situação dramática. Uma operação feita por prefeituras e estados de todo o país. Toda ajuda é bem-vinda.

O que não dá para compreender e aceitar é que o evento realizado dentro das dependências do ginásio do Guarani virasse palco para receber o ex-presidente da República Jair Bolsonaro, que veio com seu aliado de primeira hora, o pastor Silas Malafaia. Tudo em acordo com o governador de São Paulo, Tarcisio de Freitas e o prefeito de Campinas, Dário Saadi, ambos do Republicanos.

Fica a pergunta: se o objetivo era ajudar os atingidos pelas enchentes em território gaúcho, por qual motivo o prefeito e o governador não fizeram um ato público e oficial em outro local da cidade? Por que um ato nobre e necessário precisa contar com a presença de uma pessoa sem cargo e inelegível? Observação: seria errado também se fosse um ato da esquerda com a ex-presidente Dilma Rousseff. Que é presidenta do banco dos BRICs, mas não tem cargo público nenhum no Brasil. (Observação: mesmo assim fez questão de utilizar o banco para minimizar a tragédia gaúcha).

O fato é que, durante todo o dia 29 de maio, foi possível os dirigentes bugrinos, que estão sumidos para dar explicações após os jogos, ficarem disponíveis e solícitos para tirarem fotos ao lado de Jair Bolsonaro. Careca, autor do gol do título de 1978, também fez questão de posar ao lado do ex-presidente. Para variar, o clima hostil a imprensa prevaleceu. Uma profissional da EPTV-afiliada da Rede Globo na região de Campinas- preferiu se retirar do local ao sentir que sua integridade física não estava assegurada.

Resumo da ópera: o campeão brasileiro de 1978, ao invés de lutar contra o rebaixamento na Série B, preferiu gastar tempo e energia para bajular e ciceronear alguém que não tem cargo e mais colabora para rachar do que para unir o país e que dificulta convivência entre os diferentes. Não precisa pensar muito para chegar a conclusão de que o Guarani merecia um destino melhor do que virar palanque político. Triste. 

(Artigo escrito por Elias Aredes Junior-Foto arquivo Guarani F.C