No futebol campineiro, o pouco sempre é considerado bom. Até quando?

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Na semana passado, no meio da montanha de postagens e análises sobre Ponte Preta e Guarani nas redes sociais um comentário chamou minha atenção. Talvez explique os altos e baixos vividos pelo futebol campineiro nos últimos anos. “O problema é que aqui em Campinas o pouco virou bom”. Bingo. Exato.

Não foi algo que aconteceu do dia para a noite. Este espírito conformista reinante em parte da imprensa, torcida, jogadores e dirigentes foi detonado a partir de um processo lento e gradual.

Talvez o start tenha sido os rebaixamentos vividos pelas duas equipes. A Ponte Preta no final da década de 1990 e nos anos de 2006 e 2013 no Brasileirão e o Guarani com seus nove descensos a partir de 2001.

Em todas as situações, ao chegar na divisão de elite, proveniente da Série B, as diretorias, fossem no Brinco de Ouro como no Majestoso encaminhavam o argumento: o vital é ficar na Série A, galgar paulatinamente os objetivos, sem pressa, entre outras expressões menos nobres. Fugir da degola já será lucro. É o discurso dos cartolas.

Esse acanhamento vinha acompanhado de contratações modestas ou revelações que poderiam explodir. Sem a presença de revelações das categorias de base, figurino diferente daquele vivido nas décadas de 1970 e 1980.

Pense: nestes últimos 15 anos qual jogador revelado por Ponte Preta e Guarani chegou a vestir a camisa da Seleção Brasileira ou disputar uma Copa do Mundo? Luis Fabiano pela Macaca, Luizão e Elano pelo Guarani e paramos nisso. No restante, uma fábrica de atletas medianos, úteis apenas ao mercado. Duro, mas é a realidade.

O passo seguinte foi a questão econômica. Lógico que a disparidade de cotas é pornográfica e atrapalha na construção de campanhas dignas. De imediato, as diretorias vão alardear que encontraram maneiras de amenizar o quadro. A Ponte Preta com uma gestão exemplar do ponto de vista financeiro e patrocinadores aos borbotões na camisa enquanto que o Guarani tem o empresário Roberto Graziano como seu escudo.

Ótimo. Maravilha. Nem tanto. A verdade é que os dois rivais só vão entrar na era das Arenas se fatores externos colaborarem. O Guarani da boa vontade da Justiça trabalhista para conceder a carta de arrematação e obrigar o empresário a construir o novo estádio. Na Ponte Preta, tudo está na mão de Sérgio Carnielli, que admitiu na última reunião do Conselho a inexistência de recursos para a Arena.

Ou seja, o tempo passa e Campinas fica para trás . Depende única e exclusivamente de encaixes esporádicos de bons trabalhos, nunca fruto de uma estrutura azeitada e formada para revelar jogadores de qualidade, de nível de Seleção Brasileira e que em caso de venda tenha rápida reposição. Sem contar uma infra-estrutura antenada com os principais centros do mundo.

Estes dois requisitos levam ao terceiro fator: temos a pior geração de dirigentes da história. Não temos gente com experiência e trajetória no futebol. Que conheça não só o mercado de jogadores mas as mumunhas do dia a dia dos vestirários.

Inexiste este perfil na Ponte Preta como em Guarani dirigentes com formação no futebol amador, que tenha utilizado os campos de Campinas como um laboratório para as experiências que viriam a seguir.

Quem conhece a história de Pedro Antonio Chaib, formado no Gazeta na década de 1960 e posteriormente diretor de futebol da Macaca sabe do que falo. Assim como Beto Zini, que desde a adolescência se envolvia com as questões do futebol graças ao seu pai Anselmo Zini. Transformar-se em presidente e com conhecimento da modalidade virou uma questão de tempo.

O que temos na atualidade são dirigentes esforçados, dedicados, mas longe, muito longe da inventividade, criatividade e talento dos quadros de outrora. Existem boas campanhas? Sim. Geralmente fruto de bons trabalhos de comissão técnica do que produto da infra-estrutura e da filosofia oferecida. Oswaldo Alvarez, Guto Ferreira, Gilson Kleina, Giba…Todos eles tem bons resultados nos dois clubes campineiros. Você lembra dos responsáveis pelo futebol nestas ocasiões? Pois é.

Pegue a conjuntura descrita e veja a ideia rotineira entabulada pelos cartolas: de que não é possível fazer mais, o resultado tá ótimo, jornalistas não entendem nada ou devemos agradecer aos céus pela graça alcançada no gramado.

No fundo, no fundo, o discurso serve para dar motivo para uma parte da torcida praticar o auto-engano e os dirigentes praticarem o esporte que apreciam: fugir da responsabilidade neste processo de atraso, em que pouco é bom. Quando na realidade é, no máximo, razoável. E olhe lá.

(análise feita por Elias Aredes Junior)