Comunidade LGBTQIA+, Futebol Brasileiro e uma luta que não pode parar. Jamais!

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Nesta segunda-feira clubes das Séries A e B do Campeonato Brasileiro estão com ações para celebrar o dia 28 de junho, Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+. Uma data para reflexão sobre as lutas e demandas desta comunidade. Que compra. Consome. Que torce. Têm direitos e deveres como qualquer cidadão. Não pode ser alvo de preconceito e violência.

Dados não faltam para justificar a data e as ações dos clubes. De acordo com reportagem publicada pelo site da Revista Carta Capital em julho do ano passado, pesquisa construída em cima de dados do Sistema Único de Saúde (SUS) comprovou que a cada hora um LGBT é agredido no Brasil. Entre 2015 e 2017, data em que os dados foram analisados, 24.564 notificações de violências contra essa população foi registrada. Não dá para ficar calado. É preciso protestar e encampar a luta.

Se existem dados tão fortes porque alguns torcedores, jornalistas e dirigentes exibem resistência em relação a celebração da data? Vamos refletir sobre o assunto.

Luta contra o Preconceito

Clubes no Brasil são, antes de tudo, fenômenos comunitários. Surgem de atitudes coletivas. Conheço pouquíssimas agremiações fundadas pela vontade de uma única pessoa. Se a vontade é coletiva é óbvio que as agremiações refletem o comportamento e vontades construídas ao longo do tempo.

Se o time é comunitário, é evidente que no decorrer da história algumas pautas sejam incluídas e virem um reflexo da construção do time, como a luta contra o preconceito racial e na atualidade o apoio a comunidade LGBTQIA+. Corinthians, Vasco, Bahia, Fluminense são exemplos deste esforço.

Se o futebol é popular, a incorporação das lutas sociais seria algo perene e natural, correto!? Nem tanto.

O patrimonialismo como cupim que corrói o futebol e impede as lutas

Infelizmente, as cúpulas diretivas dos clubes ao longo dos anos foram tomadas por dois fenômenos. Primeiro a perda do caráter popular e uma consequência nefasta, a instalação do patrimonialismo já presente na esfera do Estado brasileiro. Os detentores do poder misturam público e privado e se acham donos da agremiação. Como muitos se acham proprietários do estado nacional. Tal comportamento leva para dentro da estrutura de poder dos clubes os vícios e problemas existentes na própria elite brasileira e em contingente (infelizmente!) relevante da classe média alta do Brasil: machismo, homofobia, assédio moral, preconceito contra pobres, assédio sexual e uma série de males que ajudam a distanciar as arquibancadas de sua paixão.

Fazer as ações neste dia 28 de junho é uma maneira de repactuar o futebol com a sociedade. Assim como acontece nas ações contra o racismo. É construir um novo modelo, em que o gramado continue como protagonista  e que as pautas da sociedade não sejam esquecidas. Dos atuais clubes de elite, o Bahia tem uma postura exemplar neste novo modelo que mistura busca de lucro (algo lícito) e representatividade social.

Os obstáculos oferecidos pela sociedade

O resultado é imediato? Difícil. Encontramos pela internet comentários que repudiam tais ações. Para estas pessoas, isto não deve ser feito porque “somos todos seres humanos”. Tais posturas são sintomas de ausência de cidadania. Ausência de noção do que é preservação e valorização da vida alheia e aplicação de conceitos como tolerância, solidariedade, empatia e conexão com as demandas das minorias e comunidades vitimas de preconceito. Individualismo em estado bruto. O que de certa forma explica os ruídos de certos nichos de torcedores com os clubes de futebol que abraçam a causa..

Os desafios para o futuro

Não é algo para ser consertado do dia para a noite. Os preconceitos dirigidos a comunidade LGBTQIA+.são frutos amargos de décadas de um sistema educacional, patrocinado pelo Regime Militar (1964-1985) e que jamais privilegiou a reflexão e a construção de ideias de pensamentos e sim a decoreba, o acumulo de informações. Quem foi criança e adolescente nas décadas de 1970,1980 e até em 1990 apenas replicam o que foi ( ou não foi) ensinado em escolas públicas e particulares. A ignorância também é um projeto de poder.

Quem destila impropérios contra a comunidade LGBTQIA+. tem perfis diversos. Profissionais liberais, operários ou cidadãos comuns que quando sentaram no banco escolar foram rápidos para assinalar a alternativa correta na prova mas hoje não refletem sobre pontos básicos do cotidiano. Foram ensinados a serem conduzidos e nunca a serem condutores. Pagamos o preço de tal desmando ao convivermos com gente preconceituosa e insensível. Toda ajuda para desmontar esta bomba relógio é necessária. E urgente.

Que os clubes de futebol continuem nesta jornada não só para conquistar títulos no gramado mas para viabilizar a superação de preconceitos enraizados entre nós e que impedem o Brasil de ser um país justo e inclusivo. De fato e de direito.

(Elias Aredes Junior-com foto de Mailson Santana-Fluminense Futebol Clube)