Caro presidente,
É até difícil chamá-lo assim. Farei um esforço para que isso aconteça, mesmo que não soe natural, já que na minha percepção um cargo de presidente exige presença, envolvimento, cara a tapa e uma dose de insanidade. Confesso que não vejo esses atributos na sua pessoa. E que fique claro que não é nada pessoal. Mas estamos falando de uma paixão em comum e essa paixão é comandada pelo senhor, pelo menos na teoria.
Acho que essa carta endereçada ao torcedor pontepretano só escancara a distância que existe entre o senhor e o povão. Encarar os microfones seria o melhor caminho. Mas não só agora. Sempre. O que vimos, ou melhor, o que não vimos foi o presidente aparecendo para dar explicações em um ano tão conturbado no Majestoso.
Até me espanta o senhor fugir de microfones tão amigáveis como são os da imprensa campineira, que quase sempre pregam um discurso de paciência ao torcedor. Paciência que dura 117 anos, acompanhada de uma imprensa que sempre preferiu ver os clubes daqui como fonte de renda, prestando um desserviço ao torcedor e ao jornalismo. Mesmo assim, o senhor prefere se comunicar com o torcedor através de uma carta. Sendo essa sua opção, vamos aos pontos que me chamaram a atenção.
Eu poderia parar de ler já nas primeiras linhas, quando o senhor escreve que a carta não se trata de um pedido de desculpas. Acho que a única coisa digna num momento como esse seria um singelo pedido de desculpas e algumas explicações que não foram dadas.
Sinto informar o senhor, mas falar que a Ponte tem 70 % de chances de ser rebaixada e depois citar como exemplo o Fluminense de 2009, assim como o Flamengo e ainda o Grêmio em 2010, clubes que, como o senhor sabe muito bem, são infinitamente mais poderosos que a nossa macaca e possuíam elencos bem mais qualificados do que esse atual da Ponte Preta, muito mal montado, que o presidente ajudou com algumas indicações bem questionáveis, é de uma covardia sem tamanho.
Aliás, a carta seria um bom momento para que as contratações equivocadas fossem explicadas. Aposto que, assim como eu, muita gente gostaria de entender a forma de avaliação das contratações da Ponte em 2017. Com o que se gastou em laterais esquerdos como João Lucas, Fernandinho e cia, não era possível fazer um esforço para manter o Reinaldo, atleta que teve identificação com a torcida no ano passado?
Qual foi a avaliação para a contratação dos volantes Naldo e Jadson? E a volta do veterano zagueiro Rodrigo? E contratações como a de Negueba, extrapolando o limite de transferências de jogadores da série A e prejudicando a vinda de outros atletas que poderiam ser melhores aproveitados? E a venda do Pottker? Foi revertida como dentro do elenco? Foi mesmo um bom negócio? E a troca de Clayson por Leo Arthur e Claudinho? Foram inúmeros erros. Não cabe um pedido de desculpas? Uma mea culpa?
Não pense que se livrar do rebaixamento vai amenizar essas e outras tantas falhas. Por isso, o momento exigia mais humildade e menos fantasia por parte do senhor. A Ponte pode se livrar do rebaixamento. O nível do campeonato é péssimo, mais da metade da tabela briga contra o descenso, tudo pode acontecer.
Mas os erros estão aí, expostos e o torcedor merece um pedido de desculpas por um 2017 que começou com a equivocada escolha de Felipe Moreira como técnico e uma ilusão chamada Campeonato Paulista , que há muitos anos não serve de parâmetro de qualidade e, até por isso, é inadmissível pensar que nem isso essa administração que se perpetuou no Majestoso conseguiu dar ao povão. Uma lástima, presidente.
Entenda, assumir que a Ponte tem suas limitações e afirmar que a diretoria está unida com jogadores e torcedores não convence nem o mais alienado torcedor, que por tantos anos foi ludibriado por um discurso chapa branca fantasiado de jornalismo de que a Ponte Preta precisa ser ajudada e não alvo de críticas, por ser um Davi em meio a tantos Golias. O reflexo disso são dirigentes mimados que não aceitam críticas, rebatendo e perseguindo quem critica chamando de “anti” e torcedor de outro clube. Parece coisa de criança, né?
Pra fechar a lamentável carta, o senhor termina convocando o torcedor a apoiar o time. Abro aspas: “Agora, quando todos os pontos são necessários, precisamos lotar o Majestoso em todos os jogos e dar nossa força ao time…”
Comovente. Um presidente que AGORA lembra do poder da torcida. Do poder do povão. Ingresso barato? Só quando a água bate na bunda. Boa parte do ano quem não paga o programa de sócio é quase proibido de emitir críticas, já que na visão dos dirigentes ter o programa de sócio mais barato da série A é o suficiente pra que o pobre assuma mais uma fatura em tempos de crise.
Saiba, presidente, que a fatura vem sendo paga pelo povo há 117 anos e a nossa gente tinha que ser CONVIDADA a frequentar de graça o Majestoso em dia de jogo. Quem segura a barra da Ponte Preta é o povão, nobre presidente. Agora que o senhor percebeu isso?
Daí do seu escritório deve ser difícil mesmo enxergar o que se passa. Acredito que nem metade da indignação da torcida chegue até o senhor. Creio que, caso chegasse, o presidente teria pavor de ser novamente o candidato da situação.
Mas daí da sua cadeira tudo parece confortável, até porque com uma imprensa que se recusa a misturar política com futebol em um ano eleitoral, ignorando que os dois andam de mãos dadas, e uma oposição que ainda não ganhou corpo (pasmem, em mais de 20 anos), o senhor pode não ter certeza em qual divisão a Ponte estará no ano que vem, mas sabe muito bem o lugar que continuará sendo seu por mais alguns anos.
Se cair, a desculpa está pronta. Menor orçamento e campeonato nivelado por baixo que todos brigaram contra o descenso. Se ficar, méritos da diretoria e elenco montado por ela que, apesar dos antis, brigou bravamente contra os gigantes do futebol.
Só me resta desejar um feliz 2018 para o senhor, presidente Vanderlei Pereira. Seja na séria A, ou na B. Acho que isso nem deve fazer tanta diferença.
Um abraço e saudações pontepretanas.
Atenciosamente,
Paulo do Valle