Após a decretação da fase roxa por parte do governo do estado de São Paulo a partir da segunda-feira, dia 15, os clubes paulistas ensaiam continuar o Paulistão em outro estado e assim fugir das medidas válidas até o final do mês.
Compreendo o quadro. Sei que a paralisação poderá acarretar em consequências graves do ponto de vista financeiro. Só que se existisse uma real intenção de colaborar no combate do quadro do agravamento da pandemia no estado, o mínimo de postura que teríamos dos clubes seria uma reformulação profunda e radical nos protocolos para jogos e treinamentos. Restrição ainda maior de pessoas em dias de jogos, mudança de procedimento nos treinamentos e instituição de multas pesadas aos jogadores que frequentarem aglomeração e ambientes fechados.
Por aquilo que assistimos na televisão, as medidas tomadas por Dória e que englobam o futebol são mais do que necessárias. São urgentes. Emprego, recursos e posses. Tudo isso podemos perder com a pandemia. Em médio e longo prazo, é possível reconstruir. A vida não. É uma. Preciosa demais para ser perdida por birra ou vaidade.
Os clubes paulistas não entendem assim. De modo imperial, tanto a federação como os clubes afirmam a sociedade: ou será do nosso jeito ou nada feito. Reconheço o tom diplomático do governador João Dória em relação as conversas com os responsáveis pela Federação.
No frigir dos ovos, a mensagem engendrada pelos clubes é a de que pertencem a um mundo a parte. De que não devem nada a ninguém.
Não há pranto. Nos últimos meses, poucos são os registros de declarações por parte de dirigentes, jogadores e treinadores sobre aquilo que se vê nos corredores dos hospitais que atendem aos 645 municípios do estado. Gente na fila por uma vaga de UTI. Médicos e enfermeiros receosos em administrar o prazo de consumo do oxigênio. Familias apreensivas são obrigadas a tratar os seus parentes em estado grave em suas casas.
Enquanto isso, personagens do mundo da bola responsáveis pela aplicação dos protocolos desfilam números e enaltecem a baixa contaminação entre atletas. Pergunto: e daí? Não há planeta bola. Existe um ramo do setor do entretenimento que está conectada com uma sociedade com 46 milhões de pessoas e que passa por grave instante. E o que ser deve ser feito é colaborar e ajudar para diminuir o quadro. Mesmo que essa colaboração tenha uma parcela ínfima na contabilidade geral.
O futebol paulista não quer adotar uma postura coletiva em benefício de milhões. Para eles, é suficiente o cumprimento protocolar do clássico “um minuto de silêncio” antes de a bola rolar. E segue a vida. Outros torcem pela vitória do seu time e indiretamente dão uma banana para a fragilidade da vida e a necessidade de precaução. Atitudes necessárias e escancaradas pelo vírus.
O futebol paulista decidiu virar as costas ao seu povo. Individualismo extremo. A esperança que escorre pelo ralo.
(Elias Aredes Junior)