Assim como em outras torcidas de futebol, o Guarani abriga gente lamentável. Preconceituosos, violentos e que considera que uma arma ou a violência é o caminho para fazer um acerto de contas com rivais. Não me deixo contaminar. Não considero que a totalidade da torcida bugrina tem esse perfil lamentável, de abraçar a violência pela violência. Até porque tive dentro da minha família alguém muito especial. Samuel Pompeo, meu único tio materno.
Lutou com a vida. Batalhou contra o vício do álcool, das drogas e teve por vezes a rua como único abrigo na fase adulta. Tinha tudo para ser mais um das estatísticas que partiram cedo em virtude de vícios corrosivos. Não foi por dois motivos: o samba e o Guarani Futebol Clube.
No caso do Alviverde, era um propagandista do timaço de 1978 e da época de ouro. Comparecia na minha casa para fazer pequenos bicos de pintura e de construção e não perdia a chance de na hora do almoço assistir o Globo Esporte ao lado do sobrinho. Descrevia jogadas e mais jogadas de Careca, Jorge Mendonça. Ficava inebriado com Zé Duarte, Carlos Alberto Silva e suas peripécias. Frequentava o Brinco de Ouro. Diante de uma vida sofrida, com salário mínimo, aquele espaço era o único em que sonhava, tinha seus minutos de rei.
Ele foi embora em 2004. Assistia ao jogo da Seleção Brasileira e teve um infarte fulminante. Morava na Vila Formosa. Quando cheguei, alguns dos seus pertences tinham sido saqueados por moradores. No alto da estante, um bonequinho do Guarani resistia. Levei comigo. É a recordação que tenho do meu tio Samuel e daquilo que deveria ser o Alviverde: alegre, criativo, livre, sem ódio. E a gente busca tal legado. Um dia aparece.
(Elias Aredes Junior)