Publicado neste domingo no “Folha Mais” da Folha de S.Paulo e originariamente no The New Yorg, o texto “Por que as pessoas são tão horríveis e mesquinhas nas brigas das redes sociais?”, de autoria de Roxane Gay deveria ser lido por todo amante do futebol e por cronistas esportivos.
Sem querer, a jornalista fez uma radiografia correta dos predicados que levam o futebol no rumo do abismo, que é o clima de guerra reinante nas 24 horas do dia. Sem contar outra consequência desagradável e que é abordado por especialistas no assunto: a repulsa a conviver com o contrário, seja ele quem for.
Estamos afundados em uma areia movediça. Não queremos enxergar as consequências em outras áreas. Não vou entrar aqui em aula de filosofia política, mas o fato é de que a discussão política na sociedade está pobre.
Vivemos em bolhas.
Se eu sou conservador, eu me recuso a conversar com quem é progressista. Se sou do ideário de esquerda, tenho repulsa e asco de quem é de direita. E esse internauta enumera nas redes sociais, os desejos mais sombrios em relação ao oponente ideológico.
E que passa pela eliminação do do oponente. Tudo errado. Pois é. Transportamos isso ao futebol. Um procedimento violento, excludente e que no que depender das pessoas envolvidas no processo flerta com o autoritarismo e o fascismo.
Existem canais de abordagem exclusiva de clubes que são bem intencionados, profissionais e acrescentam. Querem apenas incentivar a divulgação maciça daquilo que faz a sua agremiação de coração. Só que em muitos casos isso desemboca para formar um caldo de querer eliminar o rival. Não se fala nele. Ou quando se fala é para desejar o que existe de pior.
Resultado: vivemos em bolhas, com radicalismo cada vez maior e indiretamente fomentamos uma violência virtual, que, queiramos ou não desemboca nas ruas, bares e na vida social. E daqui a pouco pode se refletir nos estádios. E justificar excrescências como da torcida única.
A violência no futebol não foi inventada no Século 21. Casos e mais casos de mortes foram registradas ao longo dos anos. O que colocou combustível no espiral de violência da minoria presente nas torcidas organizadas. Nunca esqueça: de 100 torcedores organizados, apenas seis estão envolvidos em atos de violência de acordo com o professor Maurício Murad.
Só que, antes mesmo da pandemia, esta fissura por canais, podcasts e produtos que falem exclusivamente de um clube gerou uma consequência nefasta: o desconforto pela convivência com quem torce diferente de você. Não há mais dialogo, troca de ideias e as piadas saudáveis que fomentaram as rivalidades espalhadas pelo Brasil. Ponte Preta e Guarani, por exemplo. Vivemos um futebol solitário, sem interatividade.
Falar do rival não é apenas deferência é sinalização de paz. É gesto fundamental para perceber que ele faz parte do seu convívio, do seu dia a dia e do seu mosaico de desempenho, seja na vitória ou na derrota.
Desumanizar o rival de campo, ignorar a sua existência – ou desejar o seu extermínio- é apenas o toque final de um desejo coletivo autoritário e opressor. Quando alguns canais de clube seguem nesta espiral ajudam a perpetuar um esporte cada vez mais voltado ao desejo de vitória e não ao seu objetivo, que é a de ser um instrumento de entretenimento e convívio. Nem que seja com o diferente.
No futebol, você não deveria desejar a extinção do seu adversário. O desejo deve ser vencê-lo. Todos os jogos. E de preferência, mais tarde, tirar um sarro do rival derrotado, tomar um chopp e reforçar o verdadeiro sentido do futebol. Que está sendo perdido.
(Elias Aredes Junior- Foto de Ari Ferreira/Red Bull Bragantino)