Carta Aberta do estádio Majestoso ao torcedor pontepretano

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Olá? Tudo bem?

Não sei como lhe tratar: amigo, irmão, pai, mãe ou companheiro. Só sei que sem você eu não existiria. Dependo de ti para preencher o vazio de concreto que tenho. Passo a semana toda na expectativa de você aparecer e me transformar em algo mágico, transbordante, sem palavras. Sua alegria é a minha alegria. Sua decepção me deixa arrasado. Desde 1948. Abro os portões e meu coração para transformar 11 seres humanos em heróis; treinadores em generais de um exército imbatível. De preferência, com a faixa no peito.

Gosto e aprecio desempenhar o papel de um palco de batalha épicas e de vitórias redentoras.

Não estranhe. Ao contrário de meus outros parceiros que existem em diversas partes do Brasil, eu não sou fruto de planos de empreiteiras; não sou resultado de negociatas de políticos e alvo de cobiça de corruptos; Eu sou fruto do seu coração, torcedor pontepretano.

Lembra quando seus antepassados me geraram? Não teve cerimônia de gala, maquete como exemplo de um milagre da engenharia. Teve sim, gente de todas as classes sociais mobilizadas para me fazer nascer. Se eu fosse humano, eu poderia dizer que não tive pai e mãe e sim fui gerado por uma família inteira. Como posso esquecer o sacríficio feito por pedreiros, engenheiros, advogados, jornalistas, jardineiros e todo tipo de anônimo para economizar recursos, tirar o pão da própria boca, adquirir tijolo por tijolo e me transformar em algo real? Não posso esquecer, não tenho esse direito.

Não sou autorizado a jogar na vala do esquecimento tantas vitórias e feitos que eu fui testemunha. Todas se constituiram moldura para sua alegria. A campanha avassaladora que culminou com o título da divisão especial de 1969; os meninos que em 1970, 1977, 1979 ousaram desafiar os gigantes. E eu estava lá, forte, com espaço pronto para abrigar nas minhas arquibancadas este sentimento único, especial e explosivo que é ser pontepretano.

Sou um memorial a céu aberto dos triunfos em dérbis. Lembra? Meu gramado parecia um palco de sonhos e fantasias, diante da existência de tantos craques. Um em especial eu não paro de lembrar. Sim, é ele, Dicá. Sim, sou feito de cimento, ferro e concreto, mas acredite, eu tenho coração. Por que como posso ignorar que um filho da terra, um campineiro nato foi meu maior astro, capaz de perder apenas três dérbis e conduzir e arquitetar capítulos emocionantes, como no dérbi de 1981, quando vencemos o primeiro turno do Paulistão? Opa! Desculpe, mas eu não consigo me dissociar de você.

Aliás, me apelidaram de Majestoso. Não só porque você me gerou e era equiparado em 1948 aos grandes estádios do Brasil e sim porque corresponde aquilo que você é: torcedor com coração, alma e sentimento majestoso. Como poderia recusar um apelido como esse?

É, mas minha existência não se constituiu apenas de alegrias. Estou triste, vazio, amargurado. Porque você quer me abandonar. Só tenho validade com a alegria do povo impregnada no ar. Bandeiras, batuques e aqueles gritos de guerra que só você, em sua infinita criatividade pode conceber.

Tudo bem, eu entendo, só que não posso negar minha tristeza por você ter me trocado por um sofá. Sim, é sua casa, tem conforto, aconchego, sentimento e privacidade. Mas eu também sou sua casa. Eu te recebo de braços abertos. Eu ofereço tudo o que posso para transformar o seu dia em um épico de alegria. Estava radiante com a expectativa da Sul-Americana. Quando abriguei 6432 torcedores diante do Gimnasia eu me decepcionei. Muito. Tinha ainda na memória os encontros contra o Velez ou o Deportivo Pasto em 2013. Estádio lotado, repleto de gente. Ponte Preta sendo Ponte Preta. E eu, esta montanha de concreto, em pleno estado de pulsação, de emoção. Queria reviver. Não deu. Por que você não quis. Paciência.

É verdade, surgiram uns primos mais ricos do que eu. Atendem pelo nome de Arena. Tem luxo, conforto, segurança, estacionamento. É difícil competir. Querem até me trocar por um desses “primos”. O que posso fazer? Só apelar para que não me abandone. Que compareça, aprecie as arquibancadas que eu ofereço, que podem não ser as melhores do mundo, mas são históricas, nutrem vínculo e glória.

Eu não desisto de você. Sei que vai voltar. Estarei aqui, na próxima segunda-feira, na escuridão da noite, com minha alma e coração escondidos sob o concreto na espera de uma semifinal no final da semana. Para te receber  novamente. E buscar uma nova vitória para que eu nunca mais saia do seu coração.

 

Fica bem.

Um abraço do seu amigo duro, feito de concreto mas que te ama

Majestoso

06-04-2017

 

(texto de autoria de Elias Aredes Junior)