Como o Guarani joga contra o pai que deseja transmitir a sua paixão ao filho

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Eu tenho uma frustração de vida: nunca fui a um estádio de futebol com meu pai. Perdi todo aquele ritual responsável por construir nossa memória afetiva: a preparação antes de ir ao campo, as resenhas após o jogo, o entusiasmo pela vitória ou o gosto amargo da derrota. Nada disso eu vivi e senti com meu pai. Torcíamos para times diferentes. O jeito foi frequentar os estádios de Campinas com meus vizinhos e amigos de Faculdade.

Quando vejo o relato de amigos e companheiros de profissão sobre a conexão e a cumplicidade estabelecida entre pai e filho na hora de torcer para o mesmo time de futebol confesso que bate um sentimento de frustração misturado com uma impotência de que poderia ter feito mais do que fiz com meu pai. Fatos da vida

Toco neste assunto ao perceber quantos pais bugrinos travam uma batalha que parece inglória. O pai ama o Guarani e quer transmitir a paixão ao filho. Quer vitórias não somente para celebrar uma boa colocação na competição mas para instalar mais um tijolinho da muralha bugrina que fica estabelecida dentro do coração de uma criança. 

Duro é verificar nos últimos tempos que o Guarani não colabora em nada para que pais exibam suas conquistas. Hoje, uma criança de sete a oito anos tem um cardápio vasto quando o tema é escolher um time para torcer. No Brasil, Palmeiras e Flamengo são maquinas de conquistar títulos. No Continente Europeu o que não falta é equipe com astros e muito dinheiro para gastar: Barcelona, Real Madrid, Liverpool, Bayern de Munique, Manchester United, Manchester City…Uma constelação!

Enquanto isso, o pai desesperado e abnegado assiste o seguinte rendimento do Guarani: nas cinco edições de Paulistão em que participou desde 2019 nunca chegou aos 20 pontos. Participou duas vezes do mata-mata. Em 2021, perdeu do Mirassol sem esboçar uma reação. No ano seguinte, caiu nos pênaltis diante do Corinthians. Na Serie B, de 2017 até 2022, apenas nos anos de 2018 e 2021, o Guarani acalentou esperança de acesso ao torcedor. Nos outros anos, a fuga do rebaixamento foi celebrada como conquista de Copa do Mundo. Questionamento: como convencer uma criança a torcer pelo Guarani diante de tal quadro? Não há pipoca e doce que consiga colaborar com o pai desesperado. 

Em resumo: quando a diretoria, qualquer uma, vende um discurso ilusão e depois não alcança o objetivo, a vergonha não é apenas esportiva ou administrativa. É a colocação de uma nova barreira para que o pai realize o seu sonho de convencer o seu filho que o Guarani é o único caminho para desfrutar a beleza do futebol. 

Fazer uma boa Série B não é apenas o passaporte para Série B. É o carimbo que falta para permitir o crescimento da torcida e fazer o sofrido pai sorrir ao final dos 90 minutos e no jogo da vida. 

(Elias Aredes Junior-Com foto de Thomaz Marostegan-Guarani F.C)