Análise: jornalismo esportivo não é entretenimento. Por que a dificuldade em aceitar ?

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A imprensa gaúcha foi surpreendida neste sábado com a decisão do Internacional de Porto Alegre de proibir a participação do jornalista César Fabris, da Rádio Grenal, da entrevista coletiva após o jogo contra o Esportivo.

De acordo com a diretoria colorada, a justificativa é de que o profissional, gremista declarado, utilizou as redes sociais para constranger o clube. Jornalistas fizeram moção de apoio e torcedores apoiaram a decisão da agremiação. Nesta todos estão errados. Especialmente o clube por interferir e pressionar por mudança na escala de trabalho da emissora.

Mais: declarar em bom som o time de sua preferência não é problema. Vai do critério de cada um. Apesar de que fornecer tal informação coloca qualquer profissional na linha de retaliação daqueles que abusam da violência e utilizam como estratégia de revide.

Nada anormal em tempos em que a estupidez e a truculência viraram valores especiais. O problema principal é como os torcedores e alguns cronistas encaram o ofício do jornalismo. Esta é a questão que poucos querem abordar.

Jornalismo esportivo não é entretenimento. Necessita de critérios rígidos de apuração e difusão como qualquer outro setor da profissão. Deveria se valorizar o diploma e o conhecimentos obtidos na graduação. Está longe de acontecer.

Temos saudáveis exemplos de como o meio acadêmico fornece bons exemplos de como valorizar o jornalismo esportivo. Na PUC-Campinas, professores como Marcel Cheida e gente que passou pela instituição como José Roberto Savianny Rey sempre instruíram seus alunos a abraçar o jornalismo com a seriedade que o ofício necessita. Infelizmente, outras instituições, inclusive em Campinas, contam com docentes que não pensam assim.

Acham que jornalismo esportivo é entretenimento. Ou seja, para essas pessoas, profissionais como Lúcio de Castro, Juca Kfouri, Mauricio Noriega, Paulo César Vasconcelos, Carlos Cereto entre outros não podem receber qualquer elogio. Perdem tempo. No fundo, esses torcedores e dirigentes e até jornalistas não tenham coragem de dizer algo trágico: que não se importam com a corrupção. Adotam um discurso moralista apenas para ficar bem na foto.

Fabris está tremendamente equivocado quando coloca em público brincadeiras que deve ser feitas entre amigos. Deveria entender que qualquer rede social é extensão do trabalho do jornalista. Não é espaço para brincadeiras e sim para informação, opinião, análise, reflexão e todo e qualquer produto que caiba no jornalismo esportivo atual. A partir do instante, que utiliza tal espaço para tal postura, ele abre espaço para detonarem sua credibilidade e seriedade profissional. Rigor excessivo? É do jogo. Paciência.

O torcedor brasileiro, no entanto, não pode ser excluído do cenário. Poucos são aqueles que sabem consumir o que é o verdadeiro jornalismo esportivo. Primeiro que cometem o erro cabal de acreditarem que somente quem torce para seu clube é que descrevê-lo. Balela. Conversa mole e fiada.

Esses torcedores o que querem na realidade é que os cronistas esportivos vendam uma realidade distorcida. Escondam as mazelas. Cubram apenas o campo e quando o resultado for ruim que se massageie o seu ego e não fale a verdade. Se o clube estiver afundado em mazelas. Se estiver em boa fase porque isso “estraga o clima positivo”. Se estiver em péssima fase também não pode porque já “pisaram demais no clube”. Patético. Comportamento infantil.

Isso vale para todas as torcidas.

Vide o comportamento de parte relevante da torcida do Cruzeiro quando as denúncias de corrupção vieram á tona pelas repórteres Gabriela Moreira e Rodrigo Capelo. Em um primeiro momento, a reação foi de perseguir os repórteres. Ameaçá-los. Por que? Faziam jornalismo. Acredite: em Campinas, não é diferente.

Resultado: enquanto profissionais sérios, dedicados e focados no exercício do ofício são perseguidos, constrangidos e ameaçados, roteiro visto em Campinas e no Brasil, quem não tem o mínimo apreço e zelo pelo exercício critico da função é elevado ao trono de glória. Enquanto quem faz trabalho sério é ameaçado em sua integridade física e psicológica.

Os desmandos proliferam nos gabinetes. As decisões equivocadas são perenes. Afinal, não dá para esperar algo melhor quando jornalistas esportivos consideram que piada é trampolim para a noticia e os torcedores querem ler, ouvir e assistir apenas aquilo que entra doce em suas almas. Não tem como dar certo uma fórmula tão canhestra. (Elias Aredes Junior)