Guarani e seu papel no protagonismo do negro em Campinas e no Brasil

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O Brasil reservou este domingo para reflexão e propagação de luta contra a discriminação racial. O dia da Consciência Negra é um marco para assegurar espaço e reivindicações a uma parcela da população totalmente neglicenciada em seus direitos. O futebol não deveria ficar omisso deste processo. Pelo contrário. Foi por intermédio da participação do negro nos gramados que o Brasil destrinchou caminhos para se transformar em potência no futebol.

Quando o assunto é direcionado aos clubes de Campinas, o tema ganha contornos interessantes.  No Guarani, negros tiveram participação fundamental nos gabinetes e no gramado para forjar uma história de conquistas e feitos. Poderia citar diversas pessoas, mas vou ficar em dois personagens emblemáticos e cujo protagonismo é inegável na história bugrina.

O primeiro é o ex-presidente Jaime Silva, falecido em 2007 aos 90 anos de idade. Comandou a agremiação em 1958, no período de 1960 a 1962 e em 1967. Nestas passagens, além de incrementar e melhorar o patrimônio social do Guarani, foi responsável pela formulação de uma nova política para as categorias de base do clube, inclusive com a viabilização de alojamento aos garotos.

Jaime Silva também atraiu grande quantidade de sócios para o clube, investindo o dinheiro da mensalidade do sócio no futebol.  Não teve resultados vultosos no seu período, mas proporcionou sementes que germinaram na década de 1978, cujo resultado final foi a conquista do título brasileiro de 1978 e o quarto lugar na Libertadores de 1979. Renato e Careca são crias desta política inovadora. E cuja participação de Jaime Silva é incontestável.

E no gramado? Não há como fugir de Jorge Mendonça, apesar de muitos atletas que fizeram história como Amaral, Amoroso, João Paulo, Zé Mario, entre outros. Após passagens pelo Náutico e Palmeiras, desembarcou em Campinas com a responsabilidade de assumir o protagonismo após a saída de Zenon ao futebol árabe e com incumbência de ser um parceiro de ataque para Careca.

Não decepcionou. Foi o artilheiro principal da taca de prata de 1981 com 11 gols e no Paulistão balançou as redes por 38, recorde absoluto na década e só inferior a Pelé, que em 1958 fez 58 gols. Terminou sua história no Guarani com 88 gols anotados e protagonista de embates históricos, como na semifinal do Brasileirão de 1982, quando fez os dois gols bugrinos na derrota para o Flamengo por 3 a 2. O jogo foi o maior público da história do Brinco de Ouro, com 52.002 pagantes  e Zico teve atuação perfeita, com três gols. Mas Jorge Mendonça desequilibrou.

Detalhe: em boa parte de sua estadia no Brinco de Ouro teve no técnico Zé Duarte um tutor e um “pai” presente para administrar e corrigir falhas de sua conduta no dia a dia e que lhe no final lhe conduziram para um final de vida melancólico. Mesmo assim, é impossível negar: ao lado do ex-presidente Jaime Silva, Jorge Mendonça é o retrato acabado de como a população negra fez diferença (para melhor!) na história do Guarani.

Nas arquibancadas, uma mudança visível: o Guarani torna-se um clube de cunho mais popular. Abriga gente de todas as raças e classes sociais. Antigamente reconhecido como um clube elitista, o Guarani parecia um território estranho aos pobres e negros.

Isso acabou. Está no passado.As arquibancadas refletem uma diversidade que só fez bem ao clube, apesar dos anos e anos de desmandos nos gabinetes. Pois é esta diversidade de raças, credos e classes sociais que poderá servir de combustível para a construção de um futuro melhor.

(análise feita por Elias Aredes Junior)