Ponte Preta, cenários do passado e conjecturas do presente que interferem no futuro do futebol

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A Ponte Preta está na penultima colocação da Série B. Algo não vai bem. O time treinado por Hélio dos Anjos é uma  decepção. Defende mal. Cria pouco. Não transmite confiança ao torcedor. São acontecimentos que atingem o coração da atual direção executiva, comandada por Marco Antonio Eberlin. Eberlin é  o principal responsavel pela montagem do time, pelas contratações e pela condução do departamento de futebol profissional. Convenhamos: Luis Fabiano é um coadjuvante. Um auxiliar de luxo. Quem comanda de fato e de direito é Eberlin.

A torcida já lhe condena nas redes sociais. A oposição sem pestanejar já começa a cobrar a fatura pelas mudanças traçadas no período eleitoral. A cada 90 minutos desperdiçados, o quadro fica cada vez mais deteriorado. A Série C parece uma realidade cada vez mais próxima.

Criticas e cobranças são normais e necessários em um quadro tão delicado. Jà se passaram 10 jogos e a Macaca não mostrou sinal de que vai deixar no passado a campanha do Campeonato Paulista, quando após 23 anos caiu para a Série A-2. O torcedor, por sua vez, não quer saber se a Macaca será atração na segundona regional. O torcedor não queria encontrar-se lá.

No entanto, atirar pedras não vai resolver o quadro por completo.. Desafoga, mas não resolve. É preciso entender os fatores que levaram a esta situação. Alguns motivos você já sabe e foram expostos. A ausência do executivo de futebol, a relutância em abraçar totalmente a Ciência do Esporte, a falta de sensibilidade para entender as novas conjecturas fornecidas pelo futebol, contratações que não correspondem ao que se esperava…Tudo isso você sabe.

Agora, algo deveria intrigar qualquer especialista e estudioso do futebol: como alguém que foi um sucesso como diretor de futebol, que montou times competiivos, sobreviveu por sete temporadas seguidas na Série A, revelou jogadores aos borbotões no Século 21 e de repente demonstra uma ineficiência que culmina com um rebaixamento e uma campanha decepcionante na Série B?

Acredite: dizer que Eberlin está defasado e sem conexão com os conceitos do futebol atual talvez seja uma parte da explica, mas não justifica tudo. Sim, Marco Antonio Eberlin é um dirigente à moda antiga. E ele não tem vergonha de defender tal conceito.

Mas o que ele talvez nem tenha percebido é que boa parte do seu sucesso no Século 21 teve como alicerce um conceito que é ausente do futebol atual: cumplicidade.

Explico.

Quando foi diretor de futebol de 1997 a 2006, não era apenas o futebol que era diferente, mas os relações também eram. Existia ainda um resquício do futebol do passado, em que o profissionalismo era misturado com um clima familiar.

As equipes de sucesso não eram apenas aquelas com talento, mas também aquelas com capacidade de estabelecer um vinculo afetivo entre todos os integrantes do processo. Incutia-se o conceito entre os dirigentes, jogadores e comissão técnica de que tudo era construído conjuntamente.

E que as personalidades deveriam ser aceitas como elas devem ser. E que o dirigente poderia cobrar e exigir sem medo de sofrer qualquer tipo de retaliação, porque, antes de tudo, estava estabelecida uma irmandade, uma cumplicidade entre os pares. Exemplo clássico: a Seleção Brasileira de 2002 sob o comando de Luiz Felipe Scolari. Hoje, sob a luz da história afirmo sem medo de errar: aquela foi uma das Seleções de maior pobreza tática entre as equipes campeãs do mundo pelo Brasil.

Tudo era compensado por um certo pacto de sangue entre os componentes. E os jogadores ofereciam as individualidades em nome de algo maior: a conquista do titulo. Tudo para agradar o treinador.

Alexandre Kalil, ex-presidente do Atlético Mineiro, também era adepto desta metodologia. Tanto que conseguiu extrair potencial de Ronaldinho Gaúcho só no diálogo. Ganhou tudo. E até hoje é tratado pelo ex-craque como “Papai”. Assim como Vicente Matheus, Eurico Miranda, Juvenal Juvencio…Homens que apostaram em uma mistura de paternidade com conhecimento do gramado e dos bastidores para triunfarem no futebol.

Eberlin também foi assim. Estabeleceu conexões profundas com treinadores como Oswaldo Alvarez, o Vadão, Nelsinho Baptista e Marco Aurélio Moreira. Tinha cumplicidade com estes profissionais. E com os jogadores. Perguntem a Piá, a Mineiro, Grizzo, e outros atletas que estiveram sob o seu comando e as declarações serão de gratidão. Tudo alicerçado no sentimento de empatia, de carinho. Mas com um comando claro. Dele, Eberlin.

Só que o futebol mudou. Muito. Demais. Ouso dizer que esta estratégia paternalista fica cada vez mais fora de moda. O resultado é cobrado de maneira muito profissional. E o jogador quer isso. Por que? Porque principalmente pelo fato que, salvo exceções, jogador não quer vinculo com clube nenhum. Produz, recebe o seu salário e vai embora. Acople isso ao fato dos treinadores também estarem acuados, cada vez com menor confiança em estabelecer uma relação de confiança com a direção. De qualquer clube.

Você pode muito bem ser competente em uma época e encontrar-se fora de órbita anos depois. Vide o que rola com Fernando Alonso, na atual Formula 01, de protagonista para quase figurante de luxo.

O passado construído por Eberlin na Ponte Preta ninguém apaga. Mas o seu fracasso na Série A-1 e na atual Série B demonstra que ele é um professor que era um craque com giz e uma lousa limpa na frente e hoje não consegue adaptar-se a uma sala de aula com computador, lousa eletrônica e programas de computador para transmitir o conteúdo.

Não basta ter conteúdo. É preciso saber transmiti-lo e reconhecer a classe em que terá a responsabilidade de ensinar. E adaptar-se rapidamente a conjuntura. Por enquanto esta sala chamada Ponte Preta está prestes a repetir de ano. Sem recuperação. Isso precisa ser evitado.

(Elias Aredes Junior)