Sete passos para reatar o casamento da Ponte Preta com sua torcida

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A Ponte Preta está em crise. No gramado, a ameaça de rebaixamento é real. No lado externo, com bem atestou meu companheiro Paulo do Valle, a relação entre o clube e a torcida é de um casal que dorme em camas separadas. Para o divórcio real é um pulo. Como resolver este imbroglio? Reestabelecer uma boa relação com a torcida é passo fundamental não só para escapar da degola, como para fazer um bom Campeonato Brasileiro.

Foi assim nos acessos em 2011 e 2014. Tal característica estava presente no vice-campeonato da Sul-Americana em 2013. Existe fórmula pronta? Não, não existe. Só que passos podem ser dados no rumo de uma reconciliação. Consegui arquitetar sete passos. Aparentemente simples, banais e capazes de um efeito positivo devastador no dia a dia da Ponte Preta. Vamos dissecá-los:

1-Diálogo: O dirigente ocupa o cargo de modo provisório. Não é dono do clube. Cuida de um patrimônio coletivo. Precisa prestar contas e conversar com os torcedores, seja por intermédio do site oficial ou pela imprensa, que também é um canal de comunicação. E o que aconteceu neste ano? A diretoria ficou muda. Todos: Sérgio Carnielli, Vanderley Pereira e menor grau Gustavo Bueno e Giovanni Di Marzio. Contratações equivocadas foram feitas, o começo no Paulista é péssimo e o flerte com o silêncio é a resposta. Nestes momentos, entrevistas quase diárias com dirigentes seria bem vinda. Declarações no site oficial sobre o que será feito e qual o pensamento do dirigente diante do imprevisto é algo salutar. A ausência, o distanciamento, mesmo que não seja real, revela medo de encarar o torcedor. Isso precisa mudar.

2- Metas factíveis: O torcedor pontepretano sonha com o título. Dia e noite. Noite e dia. A diretoria sabe disso. Até porque  deseja o olimpo. Isso não quer dizer que o torcedor aceita a ilusão, a informação truncada ou o peixe miúdo vendido como tubarão. Antes do campeonato começar, os dirigentes espalharam aos quatro ventos que a meta era o título. Mesmo com jogadores que estavam longe de serem uma realidade: Clayson, Jonas, Reinaldo, Wellington. São bons jogadores? São. Formariam um time competitivo? Sim. Mas a conquista do título seria por uma junção de fatores, nunca por um favoritismo estabelecido antes da bola rolar. Caso diferente seria se ocorresse a manutenção de Rodinei, Fernando Bob, Renato Chaves, Biro Biro e remanescentes do elenco do ano passado. Nesta erramos todos: dirigentes, torcedores e imprensa. Devemos parar de sonhar e colocar os pés no chão. A realidade é o cimento que concretizará o sonho dourado.

3- Ingressos com a cara da Ponte Preta: A atual diretoria da Ponte Preta decidiu centrar fogo no programa de Sócio Torcedor. De acordo com o site Futebol Melhor, que monitora o número de associados, são mais de 18 mil participantes do programa da Ponte Preta. Entretanto, na derrota para o Santos no Campeonato Paulista mais 48% dos ingressos vendidos foram para o setor de Geral, com preços a R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia). Não, não é o caso de exterminar o programa. Mas a torcida emitiu uma mensagem: quer ingresso barato. Até para que as classes C, D e E terem acesso as arquibancadas. Ponte Preta é povão, como muitos dizem. E o povão está distante do clube.

4- Melhoria do relacionamento com a imprensa: não adianta enrolar ou postergar. A imprensa com todos os seus defeitos é um canal importante para divulgação dos fatos. E hoje, posso dizer sem medo de errar: os profissionais que cobrem o dia a dia da Macaca fazem o trabalho alegres pela profissão e tristes pela situação em que são colocados. Informações são contestadas não para esclarecer ao público e sim para constranger o profissional. Dificuldade de acesso a sala de imprensa e uma desconfiança com a conduta de profissionais (muitos pontepretanos, diga-se de passagem) só colaboram para deixar ainda mais tenso um clima que não é legal. Solução? Uma relação cordata, respeitosa e que entenda o papel do setorista e do formador de opinião, seja narrador ou comentarista. Imprensa não está ali para alisar, puxar o saco ou bajular o dirigente ou o craque de plantão. Está ali para retratar e analisar os fatos. Se os fatos forem bem descritos e o profissional se sentir confortável na sua função, melhor o torcedor ficará informado e muito “fio desencapado” desta relação entre torcida e Ponte Preta poderá ser resolvido.

5- Falar menos de Arena e mais de Majestoso: Não existe caso de estádio com ligação tão umbilical com seu torcedor do que o Estádio Moisés Lucarelli. Foi construído pelas mãos dos torcedores. O torcedor da Ponte Preta se sente parte de cada tijolo, de cada milimetro daquele local. Nos últimos anos, ao focar tanto na questão da Arena, os dirigentes da Ponte Preta esqueceram o quanto o Majestoso é importante para a trajetória da Macaca. Em dados momentos, alguns dirigentes comportam-se em relação ao estádio como o zelador de uma chácara que deseja pedir demissão. Faz a manutenção sem o minimo amor ou até tesão (desculpem o termo). Só pensa na casa nova que está na planta. O enrosco é fácil de resolver: pensar na Arena apenas no dia em que estiver de pé. Enquanto isso, no ato, fato e discurso, o Estádio inaugurado em 1948 é prioridade. Torcedor e diretoria precisam sentir que esta é a casa da Ponte Preta. E que o adversário precisa suar sangue para sair vitorioso. 

6- Ensinar os jogadores sobre o significado da Ponte Preta: Já tomei conhecimento de que jogadores têm que assistir a um vídeo sobre a história da Ponte Preta. É um rito de passagem. É bom, mas é pouco. Muito pouco. É preciso radicalizar e transmitir ao jogador que atuar na Ponte Preta é algo diferente. Vai além do gramado. A medida a ser tomada é simples: promover conversas dos jogadores recém contratados com torcedores capazes de ensinar o que é a Ponte Preta e sua gente. Uma conversa de cinco minutos com Totó, já retratado neste site, ou com o jornalista Zaiman de Brito Franco pode valer muito mais do que um filme de três horas. Nada substituiu o calor humano. Muito menos em um time de futebol. Você pode dizer o seguinte: o futebol está profissional e nenhum jogador está nem aí. Mas quem disse que a Ponte Preta nasceu para fazer o que os outros fazem? 

7- Dirigentes com cheiro, sentimento e sabedoria do povo: Entenda: este tópico não tem relação nenhuma com condição financeira. João Saldanha, o maior comentarista esportivo da história do Brasil, tinha um cartório, boa condição material, mas não desprezava o contato com o povo, o massa. Gostava de uma prosa no boteco ou a sabedoria popular oriunda das ruas. Gostava do povo e de ficar ao lado dele.

Ninguém renega as boas intenções da atual diretoria. Pelo contrário: são pontepretanos autênticos, bem intencionados e querem o melhor para o clube. Mas na formulação das grandes decisões, o feedback do pensamento popular é fundamental. Isto está ausente em algumas resoluções da atual diretoria pontepretana. Isto só é adquirido pela sabedoria do bar, o diálogo no ponto de ônibus, a conversa ao pé do ouvido com o vizinho, a prosa com o dono da banca de jornal. Futebol aprende-se vendo na televisão, estudando literatura, no banco da faculdade, em conversas com profissionais da área e com os olhos abertos para o povo.

Quando esses e outros seis conceitos forem absorvidos pela diretoria pontepretana pode acreditar: algo vai mudar. Para melhor.

(artigo e análise escrita por Elias Aredes Junior- Foto de Fábio Leoni-Ponte Press)