Especial Torcedor Símbolo: Donana e o Racismo Estrutural Campineiro. Por Israel Moreira

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Ana Custódio da Silva, a negra Donana, nasceu na pequena cidade mineira de Claudio e chegou à Campinas por volta de 1938 os 20 anos.

Sua paixão pela Ponte Preta foi avassaladora até o final de sua vida. Ele acompanhava os jogos do time em casa e fora de Campinas por intermédio das famosas caravanas organizadas por torcedores.

Em 1977, Donana foi indicada ao concurso do extinto Jornal Hoje e foi eleita Torcedora símbolo do clube. Também pertence a ela o titulo de primeira sócia contribuinte da Torcida Jovem em 1969.

Mas por que Donana ou Nininha, assim carinhosamente chamada pelos ex jogadores, não teve sua importância e relevância acentuada em toda a história pontepretana?

O amor pelo clube foi fato marcante por toda sua vida.

Instalada na Vila Perseu Leite de Barros, região do Campos Elíseos, Donana não media esforços para acompanhar o clube do coração e participava ativamente da vida do clube. Era ela que prestava os “cuidados” a capela do Majestoso.

Católica fervorosa, Donana demonstrava todo seu amor e fé a Macaca nos dias de jogos. Chegava mais cedo ao estádio e fazia a limpeza e a manutenção da capela. Era amiga dos funcionários da cozinha, da limpeza do estádio e era tratada com muito carinho pelos jogadores.

Depois de cumprir o ritual, dirigia-se ao alambrado, seu território predileto no Moisés Lucarrelli.

Com tanta dedicação e paixão pela “Nega Véia”, porque Donana não possui o reconhecimento ou identificação da cidade e principalmente do clube?

Por que esse “apagamento” da imagem de torcedora símbolo não ocorreu (e não ocorre) com a imagem da também importante e significativa Conceição?

Conceição, outra torcedora símbolo muito lembrada e homenageada pelo clube e pela cidade, falecida recentemente (2017), deixou um legado tão importante quanto Donana. Só que ambas tiveram reconhecimento e identificação diferentes.

O nome disso é Racismo Estrutural.

Campinas foi a última cidade a abolir a escravidão no Brasil e isso fez com que o processo histórico da cidade não reconhecesse nenhuma personalidade negra como filha daqui.

O racismo estrutural pode não ser visível, mas ele está inserido em todas as formas de organização da sociedade. Segundo o professor de Direito Silvio Luiz de Almeida no livro “O que é Racismo Estrutural” (2018), o racismo tem na sua concepção estrutural que, diante do modo “normal” com que o racismo está presente nas relações sociais, políticas, jurídicas e econômicas, faz com que a responsabilização individual e institucional por ato racista não extirpem a reprodução da desigualdade racial.

Ou seja, no decorrer do período pós abolição, Campinas “normalizou” o apagamento do negro. Isso ocorreu devido a estrutura de organização da sociedade (racista) que sobrevive até os dias atuais, onde não se reconhece sua imagem como símbolo ou significado participante da construção social, econômica e cultural do município.

A Primeira Democracia Racial do Brasil, a Associação Atlética Ponte Preta , tem por obrigação, devido a sua história e importância cívica junto à comunidade negra, ser a ferramenta de combate e resistência ao reconhecer nos seus torcedores negros, a luta e o amor dedicado a ela nesses 119 anos.

Como bem definiu o professor e jornalista Luiz Saviani (bugrino), um torcedor símbolo, “geralmente constitui uma identidade do clube. Um ser que personifica uma agremiação, seus símbolos e significado histórico”.

No dia 09/10/1991, Donana partiu e deixou na memória do torcedor a imagem da mulher que dedicou sua vida ao clube do coração e a luta pra ser inserida no mundo do futebol e na história da cidade.

Donana Vive!

Israel Moreira, é metalúrgico, estudante de sociologia e pontepretano.