Reflexões, armadilhas e pontos positivos do projeto que permite clubes virarem empresas no Brasil

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O Senado Federal aprovou na noite de quinta-feira, dia 11,  o projeto que abre espaço para adesão facultativa ou voluntária dos clubes a modalidade de empresa.  Ou seja, a adesão não é obrigatória. O projeto, enumerado de 5516/2019 agora será submetido apreciação da Câmara dos Deputados.

De autoria do atual presidente do Senado Rodrigo Pacheco, o projeto cria a modalidade da Sociedade Anônima do Futebol. É um modelo de sociedade anônima, que permite ao clube a emissão de títulos, com a regulação dos clubes pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

Atualmente, os clubes de futebol são caracterizados como uma associação civil sem fins lucrativos. Com o projeto, as SAFs terão a possibilidade de levantar recursos por meio de emissão de debêntures, de ações ou de investidores. Elas poderão pagar menos tributos que uma empresa tradicional, mas terão que oferecer contrapartidas.

Com a proposta do clube-empresa, pessoas físicas, empresas e fundos de investimentos poderão participar da gestão dos times.

Entre outros pontos, o projeto determina que os diretores deverão ter dedicação exclusiva à administração da Sociedade Anônima do Futebol. Também veda a participação de integrantes do conselho de administração, do conselho fiscal ou da diretoria da SAF de um clube em outra agremiação. Ou seja, fica quase que inviabilizado a participação do dirigente estatutário, caso o projeto entre em rigor.

Aspecto importante: , enquanto as ações ordinárias de classe A, aquelas do clube que originou a SAF, corresponderem a pelo menos 10% do total, o voto do titular das ações de classe A será condição necessária para a empresa decidir, entre outras questões alterações no nome, no escudo, no hino, nas cores, no local da sede do time só serão efetuadas com a concordância do clube, detentor das chamadas ações da classe A, que deu origem à Sociedade Anônima do Futebol.

O projeto prevê, ainda, a transferência obrigatória à SAF dos direitos e deveres decorrentes de relações com o clube, inclusive os direitos de participação em competições, contratos de trabalho e de uso de imagem.

No fundo, uma temeridade porque isso abre a porta para que a parte social e deliberativa dos clubes fique inviabilizada. Afinal, quem vai se interessar em fazer parte de um clube inativo e cujo o poder de decisão dos rumos do futebol está nas mãos de outras pessoas?

Se instalações como estádio e centro de treinamento não forem transferidas ao novo controlador, o clube e a empresa deverão firmar contrato com as condições para uso desses espaços.

Evidente que  lubes como Botafogo e Cruzeiro, afundados em dividas e sucateamento de sua estrutura encontrarem no projeto uma tábua de salvação. Só que tenho uma visão diferente.

Apesar de reconhecer os inúmeros casos de corrupção e de desvios registrados nos últimos anos em diversos clubes de futebol administrados como associações sem fins lucrativos e por verificar que muitas vezes existe um desprezo contumaz dos atuais gestores e daqueles que serviram ao passado das técnicas modernas de administração, considero que os clubes poderiam continuar como associação sem fins lucrativos e com mais instrumentos de fiscalização mais rígidos. E com a discussão de uma legislação mais antenada com nossos tempos.

Empresas não são garantias de sintonia com o público alvo e de sucesso. Só recordar a reação de torcedores ingleses com a proposta da Superliga. Manchester United, Manchester City, Liverpool nenhuma dessas marcas são associações sem fins lucrativos. São empresas. Que hoje parecem distantes de seu público.

Que os clubes brasileiros pensem bem antes de aderirem ao projeto se ele for aprovado na Câmara dos Deputados e depois sancionado pelo Presidente da República. Depois não adianta chorar.

(Elias Aredes Junior)