Especial: Thiago Silva, Seleção Brasileira e um Brasil que morre dia após dia

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Quem deseja saber o que está presente na cabeça de um jogador de futebol o caminho é único: redes sociais.

Ou antissociais.

No conforto do computador, sem perguntas incômodas de jornalistas críticos e com bajuladores à disposição, os astros da bola soltam o verbo e derrubam o bloqueio determinado pelas respostas ensaiadas ditas por assessorias.

O zagueiro Thiago Silva é um deles.

Está de ressaca. Pela derrota na final da Copa América e por presenciar milhões de brasileiros que não ficaram tristes pelo revés. Torceram por Messi. Por um acerto de contas do futebol com sua história.

Em texto divulgado nesta segunda-feira no seu instagram o aviso foi dado: que ninguém interpretasse o papel de amigo quando a maré ficasse favorável a Seleção Brasileira.

Nada de pedidos autógrafos, entrevistas…Nenhuma concessão! Thiago Silva não quer amigos de fachada.

Lamento pela sua distorção de análise.

Com boa dose de reflexão, Thiago Silva conversaria a sério com os amigos que estão no seu redor. Com companheiros de jornada. Faria uma retrospectiva sobre o que ele viveu e presenciou no futebol brasileiro nos últimos anos.

Os amigos teriam lhe alertado de que não foi adequado o clima de ódio e de revanche exalado na Seleção Brasileira em 2010 na Copa do Mundo da África. Que, apesar das boas intenções, a Comissão Técnica e elenco viram fantasmas onde não existiam e isto colaborou para o fracasso colhido nas quartas de final contra a Holanda.

Um companheiro do peito deveria lhe dizer o óbvio ululante: a goleada de 7 a 1 sobre a Alemanha, na semifinal Copa do Mundo no Brasil, em 2014,  não foi um desastre inesperado. Foi  o ápice de uma campanha negativa no gramado e da bagunça que reinava nos gabinetes. Uma equipe sem estrutura tática sólida e que em nenhum momento convenceu.

O que resolveria viver na ilusão? Quando perdeu Neymar por lesão, contra a Colômbia, a Seleção viu-se órfã, sem rumo e destino.

A tempestade perfeita estava feita. Espero que seus amigos tenham lhe alertado deste enredo.

Após a desclassificação contra a Bélgica, na Copa da Rússia, em 2018, os seus amigos  lhe disseram a dura realidade: nosso atraso tático e técnico é colossal em relação ao futebol europeu.

Fruto de um futebol afogado na prepotência e na soberba de muitos treinadores e jogadores e que sofre as consequências dos desmandos e erros cometidos por décadas na Confederação Brasileira de Futebol.

Dirigentes colocados na berlinda por diversas atitudes lamentáveis. Um cenário que forma um quadro cuja beleza é bem duvidosa: CBF cada vez mais rica e clubes com risco de insolvência. E o futebol na trilha do segundo pelotão do planeta bola

De coração, espero ainda que seus amigos tenham lhe falado do ponto principal. Que está acima de qualquer taça, competição ou prêmio individual: a de que não dá para ficar calado, inerte e insensível  diante de mais de 530 mil mortes geradas por um vírus que tem vacina disponível. Que não há como ficar sem ação diante da pobreza que se espalha pelo Brasil graças a um governo federal incompetente, insensível e sem eficiência para imunizar a sua população.

Não dá como ficar mudo. Consequências negativas de alguma declaração? Que os amigos estejam ao seu lado para dar o devido apoio. Mas é preciso falar. Sempre.

Afinal  do que adianta vencer um campeonato, erguer a taça e virar as costas para tantas vidas perdidas? Vale a pena deixar o futebol transmitir uma alegria que muitos querem utilizar para esconder o luto?

Em cada vida perdida existia um corinthiano, flamenguista, são paulino, um apaixonado pelo tricolor carioca (seu clube do coração!) ou qualquer um que vive do e pelo futebol.

Amigos sinceros lhe descreveriam que exigir vacina, condições de vida aos necessitados é ato político sim. Porque viver é um ato político. Mas antes de tudo é um brado pela vida. Por um país decente.

Thiago, saiba: os seus amigos e torcedores querem o melhor para sua carreira. E sonham com uma Seleção Brasileira forte e de qualidade. Só queremos jogadores e personagens do futebol antenados com um país que morre um pouco a cada dia. E que deixa nossos amigos irem embora por causa de um vírus.

(Elias Aredes Junior-foto de Lucas Figueiredo-CBF)